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A Guiné-Bissau é um país rico em diversidade cultural e tem nas artes plásticas um reflexo da sua identidade. Apesar dos avanços na promoção e divulgação da arte guineense, os artistas locais continuam a enfrentar desafios que vão desde a falta de infraestrutura até à escassez de apoio institucional. Ismael Hipólito Djata, artista plástico, escritor, escultor e ilustrador guineense, personifica tanto as dificuldades quanto as esperanças do setor. A sua história atravessa períodos de guerra, migração e reconhecimento internacional, tornando-se um exemplo de inovação na arte contemporânea do país.
Desde os seis anos de idade, Ismael demonstrou interesse pela arte, incentivado pelo pai, que lhe dava folhas de papel para desenhar enquanto os seus irmãos estudavam. “O meu pai passava milhares de folhas em desenhos para eu ficar a copiar aquele desenho”, recorda. Esse estímulo inicial foi essencial para que desenvolvesse o talento que mais tarde o levaria a destacar-se no cenário artístico guineense e internacional.
Aos 16 anos, começou a vender as suas primeiras obras e a escrever poesia. Foi durante a guerra civil de 7 de junho, na Guiné-Bissau, que descobriu a escultura como forma de expressão. Ao trabalhar com cabaças, um material tradicional, encontrou uma forma de inovar, criando objetos como bolsas, candeeiros e estruturas ornamentais. O seu trabalho foi pioneiro na reinterpretação desse material, trazendo-lhe reconhecimento no mercado local.
Ismael Djata | 📸 BANTUMEN Eddie Pipocas
A participação e divulgação do seu trabalho em exposições levou-o ao Centro Cultural Francês, onde tomou consciência da necessidade de aprimorar técnicas. Com o apoio de artistas mais experientes, reformulou procedimentos e começou a destacar-se em eventos internacionais. A sua primeira exposição fora do país foi em Cabo Verde, seguindo-se outras mostras em Paris e em bienais europeias.
“Vimos que a nossa arte [na Guiné] ainda faltava muito em termos de técnica”, admite, referindo-se ao contato com outros artistas que lhe deram orientação para melhorar a sua abordagem artística.
Determinados a expandir a sua influência no mundo da arte, Ismael e o irmão, Lemos Hipólito, começaram a investir em exposições internacionais de maior escala. Em Paris, participaram em eventos nas famosas Galeries Lafayette, onde as suas obras foram bem recebidas pela crítica. Além disso, Ismael integrou exposições coletivas na Polónia, onde foi reconhecido pela inovação do seu trabalho.
“Criamos essa galeria aqui no mercado de artesanato e, nos primeiros anos, foi duro”
Ismael Djata
A participação em bienais e feiras de arte levou-o a estabelecer contacto com colecionadores e curadores europeus, permitindo que as suas peças fossem adquiridas para coleções privadas e galerias de arte contemporânea. O seu trabalho foi exposto também em eventos de prestígio em Espanha e Portugal, consolidando a sua presença no circuito artístico europeu.
Os esforços valeram-lhe reconhecimento internacional. O artista guineense tornou-se um dos primeiros africanos a ser condecorado na Polónia, enquanto o seu irmão Lemos recebeu uma medalha de ouro numa galeria com mais de 1.500 artistas de vários países.
Ao regressar à Guiné-Bissau, deparou-se com um cenário desafiador. O mercado de arte no país estava em declínio devido à falta de materiais e à desvalorização das artes plásticas. Para reverter esta situação, fundou uma galeria e criou uma associação de pintores, apostando na formação de novos artistas e na internacionalização da arte guineense.
Ismael Djata | 📸 BANTUMEN Eddie Pipocas
A falta de espaços para exposição e a escassez de apoios institucionais continuam a ser um entrave para o desenvolvimento das artes plásticas no país. Segundo um estudo da ADPP Guiné-Bissau, apenas três mulheres foram identificadas no setor da pintura, evidenciando também a desigualdade de género na cena artística local.
A realidade da Guiné-Bissau não é única. A nível global, as artes plásticas enfrentam desafios semelhantes em termos de representatividade e apoio institucional. Dados indicam que as mulheres são maioria nos cursos de artes visuais, mas representam menos de 30% dos artistas em acervos de museus. Além disso, artistas de origem africana ainda lutam por maior reconhecimento e espaço no mercado internacional.
Iniciativas como a Afrikanizm Art têm desempenhado um papel crucial na promoção da arte africana contemporânea, oferecendo plataformas para artistas exporem e venderem as suas obras. A Bienal de Arte e Cultura da Guiné-Bissau (MoAC Biss) é outro exemplo de um esforço para valorizar a arte nacional e conectá-la com o mundo.
No entanto, para que a arte na Guiné-Bissau alcance um patamar mais sólido e sustentável, o artista acredita que são necessárias políticas públicas que incentivem a produção artística, criem espaços de exposição e garantam formação contínua para os novos talentos. Sem um compromisso real com o setor, o risco de a arte continuar à margem da sociedade e do desenvolvimento económico do país será inevitável.
Ismael mostra que é possível construir pontes entre a tradição e a modernidade, entre a expressão individual e a representação coletiva. O seu trabalho vai além das obras que produz, servindo de inspiração a uma nova geração de artistas que veem o seu oficio como um pilar essencial da identidade nacional.
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