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Kieuny, um newcomer que quer manter viva a sua essência angolana

25 de Setembro de 2023
Kieuny, um newcomer que quer manter viva a sua essência angolana

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Com apenas 24 anos de idade, Kieuni Agostinho do Nascimento, conhecido no mundo artístico como Kieuny, traz consigo uma bagagem musical que transcende a sua juventude. A música é para si uma terapia, um espaço onde desabafa, chora, grita e sonha. Nascido em Angola, Kieuny carrega consigo as raízes da sua terra, transformando-as numa melodia única, uma fusão de experiências e culturas.

No seu repertório, o Kuduro, ritmo pulsante das ruas angolanas, entrelaça-se com o Rap, e o Afrohouse dá a cadência aos versos. Kieuny é um representante da nova escola, com muito a dizer, mas também com a humildade de quem sabe que há sempre algo novo para aprender. Para ele, ouvir, absorver e refletir são lições preciosas que procura beber dos veteranos do Hip Hop, os OGs.

Vindo da banda, como se diz na gíria angolana, Kieuny deixou a sua terra natal para encontrar novos horizontes musicais em Portugal. A sua chegada a este país marca o início de uma promissora jornada no cenário musical, uma jornada que promete ecoar as batidas de duas terras distintas, unidas pela melodia única de Kieuny.

Mano Kieuny, já cantas há algum tempo. O teu primeiro grande trabalho foi a mixtape Listen To Me. Na altura, eras mais novo e pouco sabias de como funcionava o mundo da música. Como foi o processo de criação até à concretização?

Kieuny: Foi difícil. Difícil, porque tive de pensar tudo sozinho, que escrever, que pensar bem o nome da mixtape, porque queria que o people me ouvisse. Já estava há algum tempo a lançar músicas apenas porque sim e decidi então que já estava na altura de lançar algo mais consistente. Queria lançar mesmo uma mixtape, para o people ouvir o que tinha a dizer. Daí o titulo Listen To Me a mixtape.

Kieuny / Foto: BANTUMEN

O que querias dizer às pessoas?

Kieuny: Na altura, nem sabia bem o que queria dizer, mas sentia que tinha algo importante para pôr cá fora. É muito sobre isso. Sempre gostei de ouvir bons instrumentais, aqueles que te fazem sentir coisas de alguma forma, que mexem com a tua estrutura, quer Boom Bap, Trap, qualquer género. E eu queria transmitir essa mesma vibe. Para isso tinha de lançar algo que fosse muito ao encontro da minha realidade, experiências e vivências. Muito do que escrevi, na altura, as letras refletiam muito do que eu sentia.

E, claro, tinha como referências rappers angolanos que faziam o que eu estava a tentar fazer, como o caso do Prodígio. Ele inspira-me e influencia-me musicalmente. Sou muito apreciador da forma como ele canta e escreve. Faria um colaboração com ele! Imagina tê-lo numa das minhas músicas? Que honra seria! Já tive o prazer de estar com ele mas nunca pudemos conversar, seria um prazer. Vejo-o mesmo como um ídolo praticamente.

Com o passar do tempo, a indústria musical evoluiu, principalmente no Rap. Talvez exista uma fórmula certa ou não para criar um hit e bater, que o que a maioria das pessoas querem. Pensas nisso ou concentras-te apenas em fazer boa música?

Às vezes é difícil não pensar nisso. Lá está o mercado está maior, é fácil sentir alguma pressão. Mas é algo que não penso muito porque tenho um estúdio em casa, consigo facilmente fazer música. Surge uma ideia, ouço um beat, ouço-o com atenção, a partir daí consigo criar alguma coisa. Por exemplo, tenho várias músicas feitas. Talvez pegue numa delas, comece a ouvi-la todos os dias, porque tenho que sentir-me primeiro para depois o people ouvir-me também e sentir. Daí a mixtape Listen To Me exprimir aquilo que sinto para que me pudessem realmente ouvir. É assim que funciono com a música, sinto-a, penso num coro ou refrão e trabalho a partir daí.

Este ano de 2023, lancei o EP Últimas Letras e recentemente a mixtape Vent. No primeiro EP, o título foi mesmo naquela de chamar atenção do people, porque quem lê, acaba por ficar interessado em saber do que estou a falar. No single “Última Letra”, parece mesmo que estou a confirmar que será a minha última letra, mas não no sentido literal e o EP é igual.

Kieuny / Foto: BANTUMEN

Eu, que ouvi os teus dois últimos trabalhos, sinto que existe uma evolução do Kieuny e um esforço para ser melhor do que era antes.

Claro que sim. Para além de ser uma evolução no trabalho em si, lancei um EP e depois uma mixtape, foi uma evolução pessoal e de crescimento. Por exemplo no EP, tive que fazer música sozinho. Então, a pressão caiu sobre mim, mas aquela pressão pessoal de conseguir fazer as cenas e conseguir fazer música, cobrei-me várias vezes. Porque não é fácil pegares na caneta e começares a compor uma só música, depois outra e mais uma outra. E, à medida que vais cantando, escrevendo, produzindo, vais sentido uma evolução mesmo que não queiras. O trabalho traz isso de forma automática.

Mas o processo criativo de um trabalho para o outro foi muito diferente. Na mixtape Vent já estou mais maduro musicalmente, tinha que ser muito melhor do que fui anteriormente, tinha de apertar mais comigo, não podia limitar-me, tenho de explorar mais coisas, mais músicas, mais sonoridades. Hoje em dia, para mim, já é mais fácil fazer e criar música.

Como?

Para mim é fácil, porque gosto muito de ler, e desde pequeno que canto. Mesmo sem ter noção, mas já estava dentro de mim. Muita coisa inspira-me, posso ver ali uma árvore e escrever sobre isso e criar algum tipo de momento musical.

As tuas músicas refletem muito a tua realidade e as experiências na vida ou o rapper também pode ser um ator?

Esse é o objetivo sempre mas o rapper é um storyteller, não é? Conta também às vezes o que não existe. É uma história que tem que inventar, é como um escritor ou um ator. Mas tenho, claro, o objetivo de cantar sempre a minha realidade e as minhas experiências, mas nem sempre tem de ser assim, porque para além disso, sou versátil. Posso cantar num beat de Rap, de Kizomba, posso variar, e a letra ir de encontro.

Porque o músico tem que ser criativo, não posso só ficar limitado a criar só uma única cena, tem que ser mesmo bom e criativo. Por exemplo, com meu irmão Sunshine, criamos uma música que tem a ver com love. É uma cena que não me identifica, mas tive que fazer aquilo cair nessa vibe. Às vezes, temos só de adaptar a nossa realidade.

Kieuny / Foto: BANTUMEN

No EP Vent tens mais sonoridades, não ficaste só preso a um registo, um pouco de Boom Bap, Trap, algo mais mexido, com toques de Afro-house e não só. São registos que queres manter nos teus próximos trabalhos?

Com o meu irmão já explorei outras vibes, mas claro que sozinho quero explorar mais e evoluir. Vou trazer a nossa tendência mesmo, a nossa cultura angolana para a minha música, porque estou a ver muitos rappers que pouco a pouco têm perdido a sua essência ou herança africana. Poucos são os que usam samples dos nossos cotas da banda, por exemplo, com aquela melodia própria que os caracterizava. Por outro lado, temos também os Séketxe – um grupo de rap composto por seis integrantes angolanos – que se esforçam para manter a cultura viva, fazem uma boa mistura do Rap com Kuduro, e assim estão a inovar. À sua maneira, estão a trazer a sua essência com aquilo que é nosso. E é nisso que também estou muito concentrado, em trazer o que é nosso, para que me possam ouvir e identificar de onde vim. Mas sempre que se trata de música ancestral, ou seja, música da terra, nossa, da nossa cultura, nem sempre é fácil fazê-lo. Fica a pergunta de como fazer uma boa fusão, por exemplo entre a música da terra e o Rap, ou Trap, neste caso. Tentei fazer isso com a música “Tá Levar“, onde no final ouves um pouco de Kuduro, que é o que mais me identifica.

Como disse, o artista tem de ser criativo. Não se pode limitar a fazer uma única vibe. O artista tem que respirar em vários horizontes. Quero ter a possibilidade de trazer coisas novas para o panorama musical, investir mais na minha carreira como músico, na imagem visual dos meus trabalhos, talvez fazer um projeto colaborativo com o meu irmão e quiçá um álbum. Um álbum onde escrevo e conto a minha história para o mundo.

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