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Privados: a bateria social e os afetos em risco. Você já se amou?

7 de Outubro de 2024
Privados: a bateria social e os afetos em risco. Você já se amou?

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Quantas vezes você disse ao longo desta semana que o melhor lugar do mundo é o seu edredom, seu streaming, seu pet e um copo de vinho ou cerveja? Quantas vezes você se programou para estar com alguém que você gosta e desistiu no meio do caminho, torcendo para que aquela pessoa dissesse primeiro: “não vou mais”?

Muito cansada de tudo e de todas as pessoas à sua volta?


Diagnosticada com algum transtorno emocional, seja por acompanhamento profissional ou por identificação social com o outro, aquele com os mesmos sintomas que você julga também ter?


Bateria social


Os gatilhos de conforto, em um mundo que nos consome em consumo, são desejos mais do que genuínos, às vezes são os cuidados mais imediatos para a nossa saúde mental e para o nosso entendimento superficial e condicionado sobre os significados do autocuidado. Diria que não é de se negar. Mas quantas vezes você disse não para uma interação social olho no olho, fez todo o ritual de desconexão, não descansou e acabou perdendo horas tentando escolher um filme ou passou horas rolando o feed das redes? Sem no fim compreender qual era o seu desejo.


As redes têm um grande potencial na economia dos afetos. Byung-Chul Han, em Sociedade do Cansaço e Sociedade do Desempenho, argumenta que vivemos numa era em que a pressão para maximizar o desempenho individual e a autoexploração resultam em um esgotamento mental e emocional generalizado. Em sua visão, a hiperexposição nas redes sociais e a busca constante por validação contribuem para uma forma de sociabilidade que promove a superficialidade e o desgaste dos afetos. A constante comparação e o desempenho individual exagerados criam um ambiente onde a verdadeira conexão e empatia são substituídas por interações fragmentadas e muitas vezes desumanizantes.



Sempre olho para as frases abaixo ou qualquer de suas variações, com um pensamento: Perigo! Estamos cada vez mais construindo algo que pode ser danoso à nossa própria existência – a alienação!


“Eu tenho bateria social baixa”

“Minha bateria social acabou assim que cheguei”

“Chego e já quero ir embora, não sou eu, é minha bateria social”

“Millennial sentado”


Pergunto: o transtorno emocional que você sente, é seu ou é do outro? A bateria social baixa é sua ou é do outro?


A filosofia e a psicanálise nos mostram que os desejos direcionam nossos afetos, e que estes são formados no coletivo. Lacan vai dizer que "o desejo é o desejo do Outro", indicando que nossas emoções e impulsos estão sempre relacionados à alteridade, ou seja, à exterioridade. Quando nos afastamos do convívio com os outros, perdemos uma base essencial para a formação e nutrição dos nossos afetos e a ausência dessas relações pode enfraquecer os laços que sustentam nossos desejos, tornando os afetos menos qualificados. Já Spinoza, em sua Ética, propõe que a qualidade de nossos afetos está diretamente ligada à nossa potência de agir, e ele nos ensina que quanto mais estabelecemos conexões positivas com os outros, maior será nossa capacidade de viver plenamente. Assim, ao nos privarmos da interação social, nossa potência diminui, já que os afetos, que nos impulsionam a agir e a nos conectar com o mundo, se tornam mais fracos. Estaríamos todos em risco? Aquele risco que manipula as nossas emoções e sentir?


Ao ler as perguntas acima é provável que você tenha pensado no ódio nas redes e na apatia diante de tantas mazelas.


O afeto pulsante


Uma comunidade não pode florescer em uma vida dividida. Muito antes de uma comunidade assumir uma forma e uma aparência externas, ela deve estar presente como uma semente num self íntegro: apenas se estivermos em comunhão com nós mesmos poderemos encontrar a comunidade com os outros. — Parker Palmer A citação acima faz parte do livro de bell hooks, Tudo sobre o amor: novas perspectivas.


No trecho, a autora enfatiza que viver em comunidade também é um processo de autoconhecimento, de compreensão dos nossos desejos e da importância dos nossos afetos. hooks reflete sobre como a desintegração de comunidades maiores e a criação de unidades familiares menores e mais isoladas contribuiu para o aumento da alienação e do abuso de poder. Para ela, a família não se restringe ao núcleo comum de pai, mãe e filhos, mas engloba uma comunidade inteira.


Compreender o amor, segundo hooks, é também entender o equilíbrio entre estar junto e se recolher, mesmo dentro de uma comunidade. A partir dessa ideia, surge a necessidade de refletirmos sobre o que nos leva a querer estar sozinhos. Quando nossos afetos não são cultivados no coletivo, eles se tornam desqualificados, gerando emoções superficiais e confusas, e, muitas vezes, esse desejo incessante de isolamento pode estar diretamente relacionado ao condicionamento de consumir. Trazendo as associações possíveis a esse texto, é bem provável que seu desejo de conforto-consumo esteja muito ligado à economia dos afetos que te impulsiona aos extremos das emoções e a confusão dos desejos. Sem aprender a compreendê-los, e sem reconhecer a natureza de nossos desejos, tudo se desorganiza, e o consumo se torna uma tentativa de preencher o vazio que não conseguimos entender.


Essa confusão, esse ciclo entre isolamento e consumo, é um sinal de que, para restaurar a qualidade dos nossos afetos, é necessário voltar à comunidade e ao reconhecimento de que os laços que criamos com os outros são a chave para o bem-estar que buscamos.


Você já se amou?


“Quando nós, mulheres negras, experimentamos a força transformadora do amor em nossas vidas, assumimos atitudes capazes de alterar completamente as estruturas sociais existentes. Assim poderemos acumular forças para enfrentar o genocídio que mata diariamente tantos homens, mulheres e crianças negras. Quando conhecemos o amor,

quando amamos, é possível enxergar o passado com outros olhos; é possível transformar o presente e sonhar o futuro. Esse é o poder do amor. O amor cura.” (Vivendo de Amor-bell hooks).


Bem, ao que parece, estamos carregando dores individuais quando deveríamos diluí-las no coletivo, e sendo direcionados aos afetos menos pulsantes, mais alienantes e com cheiro de morte. Não à toa, a terra também está morrendo – sua existência tem se refletido no que nós temos sido, desinteressados do sentido coletivo de existir.

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