“Gualembé”, novo single dos Seketxé, é um novo grito dos bairros na revolução do hip hop africano

28 de Março de 2025

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Com uma batida crua, versos que rasgam e a dança como forma de resistência, os Seketxé voltam à carga com “Gualembé”, uma faixa que não pede licença para entrar - invade. O coletivo angolano (sobre o qual já escrevemos várias vezes aqui) traz-nos um tema que é também um manifesto visual, político e emocional que reafirma a missão do hip hop — transformar o quotidiano em arma poética e política.


Com a colaboração do Ballet Império de África, o videoclipe, realizado por Doryzzy & Pessimista, é um retrato potente onde a dança ocupa o centro da narrativa. Numa fusão entre rua e ritual, os corpos em movimento tornam-se extensão da letra, traduzindo a dureza da sobrevivência e a leveza da resiliência.


Cada momento é oportuno para quem vem do fundo” é uma das frases que marcam a lírica da faixa, deixando claro que esta música fala com - e por - quem vive à margem. Ao longo dos versos, os Seketxé constroem um discurso que não se quer apenas ouvido, mas sentido: “Coragem, firmeza… é preciso entender a linguagem”, dizem, como se estivessem a lembrar que a linguagem da periferia tem códigos próprios, muitas vezes ignorados por quem nunca os teve de decifrar.


Musicalmente, “Gualembé” vive num cruzamento entre hip hop de intervenção, trap minimalista e afro-eletrónica urbana. A produção é densa, com um instrumental sombrio e ritmado, onde percussões eletrónicas, bass lines profundas e silêncios estratégicos criam um espaço sonoro perfeito para a palavra ter peso. Ainda assim, é na letra que se inscreve a força maior do tema. Frases como “As desilusões trazem consequências reais, então controla as emoções para não ultrapassares os sinais”; “A esperança é apenas um sonho de quem acorda. Fica ciente, meu tropa.”; “Para os meus troperas [tropas], mais lealdade, firmeza e foco”; funcionam também como alertas emocionais, códigos que falam diretamente para os jovens sobre o impacto das frustrações e da instabilidade mental em contextos de sobrevivência. Ao reconhecer a carga real das desilusões e a importância do autocontrolo, os Seketxé convocam os seus ouvintes a cuidarem do equilíbrio psicológico num ambiente que, muitas vezes, não dá espaço para falhas. A música torna-se, assim, também um ponto de escuta e empatia para quem enfrenta silêncios interiores.



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Nesta nova música, não há espaço para eufemismos nem narrativas adoçadas — os Seketxé oferecem a dureza crua da vida, vinda de onde o asfalto ainda é promessa e a sobrevivência, rotina. “Gualembé” é uma chamada urgente à consciência e à ação, sobretudo para quem já subiu alguns degraus ou acredita que a elite é um elevador social. “Sai da elite e motiva os teus manos” — dizem, num verso que funciona como recado e desafio: o progresso só tem valor se for coletivo.

A trajetória dos Seketxé ajuda a compreender o peso da sua mensagem. O coletivo tornou-se conhecido nos guetos de Luanda com um estilo próprio — o RAP CIA — difícil de rotular e praticamente inimitável. Se no início poucos compreendiam a sua proposta artística, hoje o reconhecimento é inegável, e a sua influência ressoa muito além dos musseques de Luanda.


Desde os primeiros temas, as letras dos Seketxé retratam a dura realidade de quem pouco ou nada tem, e talvez aí resida o segredo da sua popularidade. Fugir da delinquência e da pobreza foi o que os moveu inicialmente a fazer música. Hoje, assumem com orgulho que já vivem do seu trabalho artístico, mesmo que ainda não em abundância.


Mais do que fazer música, os Seketxé reconhecem que exercem influência sobre uma geração inteira. “Vocês me tiraram da depressão”, “salvaram-me das drogas e da delinquência” — são algumas das mensagens que recebem dos fãs. Para eles, a responsabilidade social é real. “Se soubermos passar a mensagem, há muita gente que pode sair deste mundo, assim como nós [saímos]”, afirmam.


Um dos maiores exemplos recentes dessa mensagem que querem passar é a música "O País Tá Em Depressão", do rapper 12 Furos, que integra o coletivo. Assiste ao vídeo aqui.


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