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Isto não é uma notícia. Também não é um artigo de opinião. É apenas um relato de quem esteve alguns dias a acompanhar de perto o Festival Square (a acontecer na região norte de Portugal) e toda a sua dinâmica.
Durante os dias 29 de janeiro e 1 de fevereiro, Braga foi o palco principal do Square, festival inserido nas comemorações da cidade como capital portuguesa da cultura. Com o tema “Mapping the Atlantic”, a iniciativa propunha celebrar o talento que vive e trabalha nas margens. A ideia era criar um espaço que, com a cultura no centro, seria também palco para a celebração da diversidade, para a descoberta de talentos emergentes e para reflexão.
E este último foi, para mim, o ponto mais importante do Square: poder pensar. Acima de tudo, poder pensar com tempo. Fora do ritmo frenético de Lisboa, onde tudo parece acontecer em simultâneo, ter espaço e tempo para pensar pode ser considerado um verdadeiro privilégio.
Braga é uma cidade calma que vive no seu próprio ritmo, mas que entende perfeitamente o seu tempo. A prova disso são as mudanças pelas quais têm passado: a nova identidade visual da cidade equilibra o peso histórico com uma pulsação contemporânea, refletida na requalificação de espaços públicos e na aposta em iniciativas culturais inovadoras. Entender esses novos tempos é também entender que descentralização não se faz sem pontes regionais e locais e esse foi um dos motivos pelos quais o Square se estendeu a Guimarães, Barcelos e Famalicão, convidando coletivos artísticos e agentes culturais dessas regiões a criar uma rede cujo objetivo era transcender os limites geográficos e dar um novo significado à descentralização da cultura. As manhãs começavam em Braga e as tardes nas cidades vizinhas, com a cidade anfitriã a puxar para si toda a programação da noite.
As conferências eram o coração do evento. E o gnration acabava por funcionar como um pequeno mundo dentro da cidade - lá dentro falava-se português, inglês, espanhol e português do Brasil. Mais do que isso, falava-se de cultura de forma consciente mas despretensiosa, da forma como ela pode ser transversal e multidisciplinar, deixando de lado os pruridos académicos e focando-se no impacto real da cultura nas suas diversas vertentes. Além do painel 'O "centro" não pode sustentar: redefinir a ideia de sucesso', debate moderado por mim e que trouxe para o palco Laura Diaz, Djo da Silva e Mynda Guevara, houve outras discussões igualmente relevantes.
Num dos painéis, especialistas abordaram a sustentabilidade na criação artística, refletindo sobre como garantir que projetos independentes não se percam por falta de financiamento ou apoio institucional. Outro debate centrou-se na interseção entre tecnologia e criatividade, com destaque para as oportunidades e riscos que a inteligência artificial traz para as artes.
Os concertos davam outra dimensão ao festival, provando que a cultura não pode ser compartimentada. Na verdade, eles funcionavam quase como uma extensão daquilo que tinha sido debatido nas conferências. Artistas emergentes, outros já consolidados, brindaram o público com performances que iam da eletrónica experimental à fusão de ritmos afro-lusófonos, passando pelo hip-hop e pelo indie rock. Era impossível assistir a um concerto sem sentir que aquela música também era um manifesto, uma continuidade do que se discutia nas salas de conferência.
O festival mostrou que cultura não é um campo isolado, mas sim um organismo vivo e multidisciplinar. O cinema dialogava com a música, a performance alimentava-se da literatura, e a política atravessava tudo. Não havia uma hierarquia entre formatos ou linguagens—havia um convite a explorar, a escutar, a experimentar.
Não havia respostas fechadas, pelo contrário, havia sempre espaço para perguntas. E talvez seja esse o verdadeiro impacto de um evento como o Square: não nos dizer o que fazer, mas mostrar que há outros caminhos possíveis, e que a cultura, em todas as suas formas, pode ser o fio condutor para os encontrar.
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