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Ao longo do tempo, está a tornar-se comum um certo menosprezo pela conclusão de um percurso académico, com os jovens a procurar um caminho mais rápido e prático para o sucesso profissional. Atualmente, muitos veem a universidade como apenas uma forma de obter um diploma que levará a um emprego corporativo insatisfatório ou ao desemprego. Com o aumento dos cursos vocacionais e outros fatores socioeconómicos, as gerações mais jovens, especialmente as negras, estão a procurar alternativas para adquirir habilidades de empregabilidade.
Com os custos do ensino superior e possíveis constrangimentos sociais, a relação qualidade/preço dum diploma versos taxas de empregabilidade, numa nação como Portugal, pode torna-se questionável. Assim, questionamos-nos se existem jornadas melhores ou mais vantajosas e acessíveis para os jovens que se preparam para ingressar no mercado de trabalho.
Especialmente para filhos de imigrantes, frequentar a universidade é ironicamente inegociável, mas também um luxo em muitos lares. Como muitos sabemos, os pais imigrantes esperam que os filhos sejam fator de excelênica em todos os patamares das suas vidas, e a todo custo, e procurem papéis que, inerentemente, lhes forneçam um rótulo de 'bem-sucedidos' nas suas comunidades e sociedade. Isto garantirá que o suor e lágrimas desses pais durante o processo de imigração não sejam um “desperdício”. Tanto faz se os filhos optam por carreiras na medicina, direito ou engenharia, os cursos CTEM (Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática) porque estes são idealizados como empregos ditos “decentes” e bem remunerados e são, eventualmente, um passaporte social. Enquanto isso, as actividades das indústrias criativas são olhadas de lado.
“Bem, na minha opinião em termos dos pais africanos “obrigarem” os filhos a ir para universidade, há muito que se lhe diga.” diz Totty, residente em Leeds, Inglaterra, e fundador da Monodreadlocks. “Acredito que há duas faces da moeda quando se considera uma licenciatura, um lado negativo e outro positivo. Negativo por não valorizarem o que os seus próprios filhos querem realmente ser no futuro, que às vezes não envolve uma licenciatura ou uma jornada académica. Do outro lado, positivo porque, parecendo que não, há um incentivo e uma motivação para que os filhos tenham a capacidade de visualizar um futuro para além do seu bairro e das barreiras sociais que nos é imposto. Existe, no final do dia, uma pressão em ambos os lados que a bem ou a mal requer muita empatia e paciência dos pais e das nossas comunidades também.”
Vitor Santos, mais conhecido por Totty, descobriu a sua paixão por rastas, aos dezoito anos mas, após vários elogios de amigos e próximos a quem ele cozia e enrolava as rastas, aos 23, com o apoio da sua companheira, Shirley Diniz, decidiu avançar para o próximo nível. Investiu no seu dom com as agulhas e foi adiante com o sonho de tornar-se um loctician - um especialista em rastas e tratamentos capilares das mesmas, num nicho até então mal atendido. Devido ao poder que as rastas têm na nossa comunidade, pois marcam a resistência da comunidade africana em relação a padrões ocidentais de etiqueta, assimilação e políticas de respeito, tanto fortemente presentes na Diáspora como nos países de origem; apenas quando se mudou para o Reino Unido é que Totty viu que seria algo com o qual ele poderia monetizar ou construir um negócio.
“Quando digo às pessoas, principalmente aos meus clientes, que não foi preciso ir para a universidade e fazer uma licenciatura para estar onde estou, imediatamente, as pessoas encontram-se numa posição em que questionam se é mesmo necessário estudar para ser bem-sucedido, tanto quanto eu, ou para gerir um negócio próspero”, explica. “Não precisei recorrer a uma licenciatura porque desprezo o poder ‘incalculável’ que costumamos dar às universidades”. Atualmente, Totty administra um negócio renomado em Leeds com mais de 80 clientes mensais e uma base de fãs leais em todo a Inglaterra, juntamente com uma demanda interminável.
Estabilidade e segurança no emprego geralmente estão associadas a diplomas, mas a vida pós-universidade nunca pareceu tão pouco atraente numa era e geração pós-pandemia. Com a crise do custo de vida e o crescente aumento das contas, especialmente de acomodação, os jovens encontram-se, mesmo com um diploma, em empregos mal remunerados e superqualificados.
Totty descreve o percurso de construção duma marca sem as estruturas do ensino superior como “uma jornada natural e que fluiu com o passar do tempo. Fui analisando outros negócios que me inspiravam e prestando atenção ao mercado”, afirma. “Na altura, até ponderei ir para a universidade estudar Gestão de Negócios, mas apercebi-me com o tempo que aprende-se mais na ‘rua’, que é vida real. Acaba-se por conhecer os truques todos no sector ao falar com as pessoas certas. Não tirando o mérito aos licenciados mas, às vezes, as chances são mais promissoras no outro lado do quintal e atirarmos-nos de cabeça a uma licenciatura não é a melhor opção”.
Todos estes questionamentos ganham maior peso quando a sustentabilidade da família, sobretudo de imigrantes, depende também dos filhos. Assim, continuar por mais três ou cinco anos a estudar, pode não ser uma possibilidade financeiramente viável.
A experiência universitária costuma ser romantisada e a obtenção do diploma é tido como o seu auge, mas há vários outros fatores que devem ser avaliados e que fazem parte da experiência de muitos. Desde questões de adaptação em ambiente académico onde pouco ou nada se espera destes alunos, até ao elitismo, a dificuldade no acesso a informações, barreiras estruturais e culturais, entre outras.
Não obstante, optar pela via do emprego imediato ou do empreendedorismo também não é um mar de rosas. No segundo caso, apesar das vantagens ao trabalhar por conta própria, fazer o seu próprio horário, não estar sob os comandos de ninguém e saborear os frutos do seu trabalho duro, o empreendedorismo é também sobrevalorizado e excessivamente romantizado nas redes sociais. Totty relata que durante e depois da pandemia, a vida de muita gente mudou, especialmente devido às redes sociais, incluindo a sua. “Enquanto muitas pessoas vingaram ao decidirem ser influencers, o meu trabalho e o de muitos outros também cresceu nessa temporada. Apesar das circunstâncias, foi um momento valioso em que muitos de nós fomos brindados com o tempo para nos focarmos mais no nosso crescimento pessoal, em todos os sectores das nossas vidas. Para mim, foi um abre olhos porque levou-me ao planeamento e à abertura da minha loja na altura.”
Contudo, nas redes sociais apenas o positivo é realçado. “Nas redes sociais, o behind the scenes cabe à nossa imaginação, ou seja, só mostramos o que nós queremos”, expõe Totty. Desde investimentos de rios de dinheiro, tempo e paciência, desenvolver e estruturar um negócio exige muita energia. E, muitas vezes, os jovens adultos não têm todos esses fatores sob controle. “Trabalhar por conta própria foi a melhor decisão que já tomei até hoje. No entanto, requer muita responsabilidade e transparência contigo mesmo. Há que saber reconhecer quando é necessário dar um passo atrás, recalibrar e ver onde há espaço para melhorias, seja a nível profissional ou pessoal.“
Totty esclarece que um dos meus maiores desafios do início dessa jornada foi fazer a transição do emprego normal para o trabalho por conta própria. "Estive quatro meses sem tirar folgas e só me dei espaço para descansar quando me apercebi que já poderia viver simplesmente à base do meu talento. Todavia, tenho que reconhecer que a maior recompensa veio dessa exaustão: a abertura da minha loja”, sublinha.
Independentemente das recomendações e experiências dos outros, não há soluções únicas e nem estáticas. Escolher ingressar na universidade, num curso técnico, na via do empreendedorismo ou do trabalho por conta de outrem, é uma escolha que depende de vários fatores e da experiência de vida de cada um.
Totty acredita que é função dos pais proporcionar um espaço seguro, sem pressão, para que os filhos decidam que percurso lhes convém.“O meu conselho para os jovens indecisos e com dificuldades em imaginar uma vida académica estável, mas com o impulso de criarem o seu próprio negócio, é que se sentirem que não precisam de fazer uma licenciatura para ser bem-sucedidos é só acreditarem em vocês mesmos. E aí, provém aos vossos familiares e amigos que não foi preciso muito para dar certo. Eles só precisam de estar do vosso lado e estar lá para vos apoiar,” pondera. “No entanto, recomendo que encontrem mentores, façam muita pesquisa e explorarem as vossas opções de aprendizagem, e talvez investam em algo mais diversificado, mais barato e menos intenso que uma licenciatura, já que não querem ir para a universidade mas aprender nunca é demais.”
O caso de Totty é uma questão de grande capacidade empreendedora e uma vontade de prosperar. E diante deste trade-off, ele acreditou que a experiência adquirida ao longo dos anos lhe permitiria construir um negócio com bases sólidas ao invés de mergulhar primeiro numa jornada acadêmica. “Aprendizagem é um processo pelo qual estou a passar todos os dias. O meu maior objectivo é ser o melhor loctician que há no Reino Unido e ter vários cabeleireiros pelo país todo”, manifestou.
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