Centenas de pessoas juntaram-se na madrugada de hoje em Maputo para testemunhar o regresso do rapper moçambicano Azagaia, um ano e meio após uma ausência do principal músico de intervenção dos palcos.
O concerto iniciou-se à hora prevista na discoteca Coconuts e prolongou-se pela madrugada, sob o olhar atento de centenas de pessoas que, logo nas primeiras horas da noite de sexta-feira, já disputavam um espaço privilegiado para testemunhar o regresso do “incansável herói do povo”.
Conhecido pelo teor crítico e frontal das suas letras face ao governo, “mano Azagaia”, como é carinhosamente tratado, regressou aos palcos após anunciar o fim da sua polémica carreira, marcada por detenções, ameaças, uma doença e uso de drogas.
Com a sua habitual balalaica, Azagaia mostrou a frontalidade do costume e, quase sempre acompanhado pelo público, cantou algumas das suas mais importantes músicas, entre as quais “Combatentes da Fortuna” e “Música de Intervenção Rápida”.
Entre as cordas afinadas da guitarra da banda “Cortadores de Lenha”, os gritos dos fãs, maioritariamente jovens, e discursos do primeiro Presidente de Moçambique independente, Samora Machel, Azagaia criticou metaforicamente a situação que Moçambique vive.
“O que custa para maçaroca [símbolo do partido Frelimo, no poder há 40 anos] dar uns grãos à perdiz [signo da Renamo, maior partido de oposição em Moçambique]?”, questionou o rapper no meio de uma das suas músicas.
Num momento em que se agrava a crise política e militar entre as duas forças dominantes em Moçambique e que são cada vez mais questionadas as qualidades das lideranças, há quem veja no retorno de Azagaia “uma esperança”, argumentando que, mais do que músico, é um “cantor das dores do seu povo”.
“É crucial um Azagaia neste momento político”, declarava Manasse Chauque, enquanto comprava a camisete do concerto, ostentando o título de uma das mais célebres músicas do “rapper”, as “Mentiras da Verdade”.
Para Denisa Maura, uma fã “incondicional” do “rapper” e que, mesmo com uma gravidez de sete meses, não resistiu a presenciar o regresso do seu ídolo, “Azagaia é a voz do povo oprimido e, ao mesmo tempo, é a voz de uma geração que quer mudanças para este país”.
Apesar de admitir a importância de músicos de intervenção social no contexto de uma crise política, Rui Lamarques, jornalista moçambicano, entende que o “problema político de Moçambique é maior do que qualquer Azagaia”.
“Os músicos de intervenção social são muito importantes, mas acredito que Azagaia não vai mudar muita coisa nesta história”, observou o antigo chefe de redação do semanário “A Verdade”, acrescentando, no entanto, que o artista conseguiu “furar o esquema” entre os músicos críticos banidos dos media tradicionais.
Além de problemas com as autoridades moçambicanas devido ao uso de ‘cannabis’, Azagaia, cujas músicas não passam na rádio e televisão públicas, já foi chamado para interrogatório pela Procuradoria-Geral da República, que considerou a sua música “Povo no Poder” uma incitação à violência.
P/Lusa
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