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Catchupa Factory, tempo e espaço criativo no Mindelo para artistas dos PALOP

August 3, 2021
Catchupa Factory, tempo e espaço criativo no Mindelo para artistas dos PALOP

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Imagina estares numa ilha de Cabo Verde, com condições favoráveis para desenvolveres a tua arte, mentoria e curadoria de formadores experientes. É o que acontece no Catchupa Factory (CF), um programa de incentivo à criação artística em formato de residência artística.

Direcionado a fotógrafos e artistas emergentes dos PALOP, o programa fomenta a criação de uma rede de fotógrafos e artistas emergentes; estimula o reconhecimento e a visibilidade internacional do trabalho autoral em fotografia; incentiva a mobilidade de artistas e obras de arte; promove a formação avançada ao nível da concepção, desenvolvimento e edição de um projecto fotográfico; proporciona um espaço dedicado de criação, diálogo e partilha entre fotógrafos e artistas dos PALOP e de África, proporciona o contacto dos participantes com curadores e educadores internacionais de destaque no âmbito da fotografia contemporânea Africana e promove o emprego e a profissionalização do trabalho artístico em fotografia.

A Catchupa Factory tem organização da Associação Olho-de-Gente (AOJE), – membro da organização “Centres of Learning for Photography in Africa” que, desde 2013, dedica-se à promoção da Fotografia em Cabo Verde, contribuindo de forma decisiva na divulgação de autores cabo-verdianos e tendo percurso marcado por diversos workshops, residências, exposições e criação e organização do Festival Internacional de Fotografia de Cabo Verde (FIFCV).

A direção artística é de Diogo Bento, fotógrafo, formador, curador, graduado em Fotografia e Arte Contemporânea e membro fundador da Associação AOJE, que tem o apoio de duas excelentes profissionais, na produção Simone Rodrigues e na direção financeira Nadira Delgado.

A V edição, que decorreu entre o mês de junho e julho, contou com 11 fotógrafos participantes: Hélio Buite (AO), Magno Daniel (AO), Suekí (AO), Cleudir Rocha (CV), Janeth Tavares (CV/PT), Kimberly Dias (CV/NL), Stephanie Silva (CV), Samba Baldé (GW), Filomena Mairosse (MZ), Silasse Salomone (MZ), Tina Kruger (MZ/DE).

O educador principal foi Akinbode Akinbiyi (NG/DE), aclamado fotógrafo de origens nigerianas, nascido em Inglaterra, residente na Alemanha. A sua carreira começou em 1977 e tem o principal foco fotográfico nas megacidades em expansão, em vários países, e vagueia pelo seu tecido urbano e arquitectónico, numa tentativa de compreender e envolver-se profundamente com a metrópole moderna e no significado e subjetividade do quotidiano. Akinbiyi é também curador e formador internacional na Alemanha, Nigéria, Sudão, Suécia, Inglaterra, Estados Unidos, Grécia, entre outros. Expôs ainda os seus trabalhos em conceituadas casas e eventos e em 2019 foi curador convidado da XII edição da Bienal Africana de Fotografia, Bamako.

Eustáquio Neves foi o educador e curador convidado. O artista visual brasileiro destaca-se pelos seus trabalhos multidisciplinares, construídos por processos de experimentação com linguagem fotográfica, e também plástica/pintura, utilizando camadas, sobreposições de imagens e procedimentos químicos. Graduado em química, desde os anos ’90 as suas narrativas discutem a sociedade e o lugar histórico da população negra, abordam temáticas relativas à identidade e à memória da cultura afrodescendente com trabalhos de corte social e crítico. Venceu diversos prémios no Brasil e tem recebido a consagração do público e crítica brasileira.

A residência contou ainda com Alfredo Brant, também do Brasil, como curador convidado. O fotógrafo residente em Portugal, que está a fazer um doutoramento em Estudos de Cultura, na Universidade Católica Portuguesa, decidiu utilizar a residência Catchupa Factory como objeto de estudo e tese. Acompanhou toda a residência, entrevistou os participantes, promoveu uma conversa pública no Centro Cultural do Mindelo, entre os curadores com participação do público, tendo uma enorme relevância na compreensão sobre o trabalho desenvolvido na residência, de fora para dentro.

“A CF é antes de tudo uma iniciativa política. Dá visibilidade à produção fotográfica Africana. Pelas discussões que aconteceram durante a residência percebemos que há um posicionamento muito engajado, não só dos PALOP mas da fotografia Africana num todo. É genuinamente multicultural. Uma particularidade interessante que encontrei na residência é que os participantes utilizaram a fotografia para tratar questões pessoais, que acabaram por ter uma leitura universal do mundo contemporâneo. A escolha dos curadores foi muito coerente com o propósito da residência, não foram só curadores fazendo uma crítica artística, mas também educadores e conselheiros; evidenciaram a discussão sobre como a fotografia pode ser uma resposta para questões sociais em vez da fotografia para retratar algo apenas. Os dois curadores ampliaram o panorama da residência, com o seu largo conhecimento, seja do continenteafricano, ex-colónias portuguesas ou da diáspora e focaram num processo pedagógico relacionado ao país de cada fotógrafo e interligando com a cidade do Mindelo”, afirmou Alfredo Brant.

Na cidade do Mindelo, São Vicente, durante três semanas de trabalho intensivo, os participantes foram orientados na concepção e criação de um projeto fotográfico, sendo privilegiada a construção de uma estrutura narrativa. O trabalho de campo, pesquisa e experimentação foram acompanhados por sessões teóricas em torno de questões críticas relacionadas com a fotografia contemporânea africana, de ordem social, cultural, económica e até espiritual.

Samba Baldé, o primeiro fotógrafo guineense a participar na residência, referiu que “Catchupa Factory é uma iniciativa que deve ser apoiada por organizações culturais de todos os países membros da CPLP, uma vez que o seu campo de atuação é para artistas emergentes desta comunidade. Em relação à residência, todos os momentos, seja sessões em sala ou atividades fora, foram importantes, o meio onde fomos inseridos, as pessoas escolhidas, as discussões e partilhas foi tudo crucial para o meu desenvolvimento e tudo muito bem estruturado pela organização”.

A Catchupa foi guarnecida de atividades outdoor, como uma tour em bicicleta pela cidade, subida ao ponto mais alto da ilha, o Monte Verde, caminhadas na região do Calhau, mergulhos junto ao vulcão extinto, ida à Baía das Gatas e outros convívios em grupo, que proporcionaram melhor interacção e elos de amizade. “A Catchupa foi um espaço para poder voar, ter tempo de criar, escutar, desacelerar, de experimentar novas formas e novos processos. Os longos debates sobre a fotografia, e o nosso convívio entre risadas e praias, foi o que deixou esta residência mais doce ainda. Uma verdadeira Catchupada de tudo que é bom”, comentou a artista multidisciplinar Tina Kruger.

Os diferentes backgrounds de cada participante e mentores/curadores tornaram uma residência rica em ideias, partilhas, conhecimentos e visão sobre o contexto africano em que estão inseridos.
 Suekí, também artista multidisciplinar, angolano residente em itália, partilhou: “Esta foi realmente uma Catchupa com nutrientes para o corpo, mente e alma. A interação e partilha de visões com dois grandes protagonistas da fotografia contemporânea foi simplesmente uma experiência de valor inestimável. Todo o conhecimento adquirido foi complementado por uma forte conexão ao Mindelo e reforçado pela cumplicidade e elos emocionais que se criaram entre os participantes/ formadores/ organização”

A residência culminou numa sessão pública de apresentação e mostra dos projetos resultantes. E os mesmos estão expostos no Centro Cultural do Mindelo, onde permanecerão durante o mês de agosto, num manifesto na rua, nas janelas do Centro Cultural, de forma a proporcionar um contacto directo entre a arte e o público que comumente não iria ao Centro Cultural. Incitando assim a uma paragem reflexiva a quem por ali passar, sobre os temas abordados pelos fotógrafos.

Outro ponto bastante interessante da Catchupa Factory é que o acompanhamento dado aos fotógrafos participantes não termina no fim da residência, há continuidade, sendo que os mesmos serão apoiados para a continuação ou exposição dos seus trabalhos e continuarão a ser partilhadas oportunidades para os artistas desenvolverem. Como disse orgulhosamente Diogo Bento, director artístico: “já somos uma família, a Catchupa Family.

Toda a iniciativa também foi possível devido à principal entidade financiadora, a Fundação Calouste Gulbenkian (PT); este ano com o adicional apoio do programa DIVERSIDADE – Instrumento de financiamento para a diversidade cultural, identidade e cidadania – lançado pela União Europeia gerido pelo Camões, Centro Cultural Português no Mindelo, e ainda o GOETHE – institut Angola (DE/AO). Além dos parceiros locais: Universidade M_EIA, Centro Cultural do Mindelo, Centro Nacional de Artesanato e Design, Universidade de Cabo Verde, Hotel Terra Lodge, Guesthouse Soncent, Ímpar Seguros, Djambai Tours. E os parceiros institucionais, o colectivo cultural e filantrópico PÉS DESCALÇOS (AO) e CI.CLO plataforma de fotografia (PT).

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