Lilianne Kiame, as novas formas de pensar a arte, a arquitetura e a transformação social em Angola

February 11, 2025
Lilianne Kiame

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Lilianne Kiame é uma arquiteta e designer angolana. Licenciada em Estudos de Arquitetura pela Universidade da Cidade do Cabo (África do Sul), realiza trabalhos centrados em intervenções urbanas e projetos com potencial para melhorar as condições de vida nos bairros urbanos mais desfavorecidos da sua cidade natal, Luanda. Através da interpretação das tradições locais, propõe soluções que aliam a contemporaneidade e padrões ecológicos, sem descurar o papel que arquitetos e designers podem ter na realização e criação de projetos que, de alguma forma, possam responder e combater as alterações climáticas.


"A minha prática artística nasce da necessidade de examinar a continuidade temporal e os discursos que emergem dela”. O seu trabalho incorpora elementos do quotidiano angolano e referências visuais que evocam processos de exploração de recursos, territórios e corpos. Através do recurso à pintura e à escultura, explora também as interseções entre o passado e o presente, desconstruindo narrativas históricas e culturais. "Tento conciliar aquilo que observo com o que é informado, criando uma ponte entre experiência pessoal e memória coletiva", revela acrescentando que as experiências pessoais e coletivas são fatores determinantes para estabelecer o equilíbrio entre a memória e a realidade contemporânea. 


Ao abordar temas como extrativismo e desigualdade social, Lilianne utiliza materiais e técnicas que remetem para o desgaste e transformação, expressando, assim, a dinâmica cíclica de exploração presente na história angolana. A artista vê no seu país o principal ponto de referência para o trabalho que desenvolve. "Escolho observar o meu meio envolvente e identificar como interage com elementos externos. Pergunto-me quais destas ocorrências só existem devido a uma sequência específica de eventos peculiares a este espaço". Esse processo de observação resulta em esboços que, posteriormente, se transformam em pinturas e esculturas.



Lilianne Kiame à direita, juntamente com outros artistas e Mehak Vieira, co-fundadora da galeria Jahmek. Fotografia cedida pela artista.



Recentemente, participou num evento da Forward Art Stories, uma iniciativa que coloca artistas africanos em diálogo. Para Lilianne, essa troca é essencial para ampliar a compreensão sobre as dinâmicas da arte no continente. "Cada artista traz referências e experiências distintas que muitas vezes partem de questões comuns, como memória, território e identidades em transformação", explica.


A internacionalização da arte africana é, segundo a própria, um processo que, apesar de desafiante, está repleto de oportunidades. A exposição "Visões do Efêmero", em exibição na Forward Art Stories até 30 de março, em Luanda, e a publicação de um livro em colaboração com as curadoras Paula Nascimento e Suzana Sousa são exemplos práticos dessa perspetiva, onde ampliar o diálogo entre artistas africanos e a diáspora é tido como um dos principais mecanismos de crescimento. De recordar que a falta de um mercado de arte consolidado, com galerias, colecionadores e leilões que possam valorizar e comercializar a produção local, bem como a escassez de financiamento público e privado para as artes são alguns dos desafios que Lilianne e outros artistas enfrentam. Aliada a estes fatores está também a dificuldade no reconhecimento global da arte africana fora de círculos específicos. Apesar de um crescente interesse, ainda há desafios para alcançar outros mercados.



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O trabalho de Lilianne passa por uma investigação extensível a todo o processo criativo. "Desenho bastante e há sempre uma fase de incubacão, onde as ideias amadurecem antes de ganharem forma", revela. A experimentação também desempenha um papel central na sua prática, permitindo explorar novos materiais e técnicas a partir do contacto com outras disciplinas.


Lilianne acredita que o papel da arte na sociedade vai além daquilo que chega ao público. Não esconde que esta pode ser um agente de reflexão e ampliação de perspectivas, seja pela construção de novas narrativas, seja pela desconstrução de conceitos já estabelecidos. "A arte nos faz pensar, sentir e questionar o mundo ao nosso redor. Pode contar histórias, trazer à tona realidades invisíveis e abrir espaço para novas conversas", afirma. Embora reconheça os desafios do percurso artístico, Lilianne adota uma postura de resiliência. "Os desafios são múltiplos, mas procuro olhar para o lado positivo e trabalhar com os recursos que tenho ao meu alcance. Haverá sempre uma necessidade de reinventar caminhos".


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