Como posso transformar um passatempo numa carreira?

February 6, 2025
querida deborah 3

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Querida Déborah, é uma coluna de cartas para criativos em crise. Envia a tua pergunta para deborah@bantumen.com, menciona os teus pronomes, contexto e como queres ser chamada. Todas as perguntas são respondidas anonimamente. 

 

Querida Déborah,


Tenho 56 anos e vou reformar-me em breve. Sempre gostei muito de trabalhos manuais, sou da geração que aprendeu a bordar e a costurar na escola, mas nunca tive coragem de fazer disso uma profissão. 


Acho que em parte tem muito a ver com a minha mãe, dona de casa, sempre ter insistido que eu tivesse uma carreira, fizesse algo grandioso profissionalmente. A verdade é que não me arrependo. Fui muito feliz na minha profissão e tive experiências fantásticas, mas num cantinho do meu pensamento sempre existiu um e se…? Nunca era o momento certo e tinha medo de largar um emprego financeiramente estável para seguir a ideia de um sonho. Mas hoje, já bem mais madura, penso muito nesse e se… A questão financeira já não é um empecilho e, com a reforma, terei tempo. Mas como começar? Por onde começar?


Vejo muito nas redes sociais mulheres da minha idade e até jovens meninas a seguirem por esse caminho e a serem bem-sucedidas e pergunto-me quando é que eu terei essa coragem.

Depois de ler as cartas que escreveu, pesquisei um pouco sobre a sua trajectória e admiro bastante a sua coragem de ter conseguido fazer o que que não consegui, Déborah! Gostaria de ter um bocadinho dessa ousadia para também seguir a minha paixão.


Querida J, 


Muito obrigada pela tua carta e por acompanhares a coluna. Eu aqui trato todo o mundo por tu, independentemente da idade, pois acredito que esta troca de confissões epistolares, em forma de coluna de conselhos, já nos dá uma certa intimidade. 

Confesso-te que muitas vezes me esqueci do caminho atribulado que fiz para chegar até aqui, e agradeço-te por me lembrares. Sobre coragem, ah, é algo tão relativo… Sempre achei também corajoso quem optou pela estabilidade financeira e por seguir uma carreira mais tradicional, como tu. 


Acredito que a tua história é mais comum do que pensas e que existem muitas pessoas de idade adulta avançada que têm esse desejo de se reinventarem profissionalmente, mas não sabem como. Sinto-me honrada por confiares em mim para te auxiliar a dar os primeiros passos em direcção à materialização desse sonho e digo-te já que estás num óptimo lugar para o fazer com tranquilidade e para ir descobrindo do que gostas e como gostas. O facto de a parte financeira estar estável, dá-te essa flexibilidade e o facto de teres tempo, agora com a forma, dá-te o espaço para mergulhar no universo do bordado e da costura sem culpa. 


Poderia escrever-te uma longa lista de acertos e erros que cometi na minha jornada empreendora, bem como conselhos que fui coleccionando desde 2020, mas acho que te iria sobrecarregar de informação. Não quero que te sintas pressionada mesmo antes de começar! Projectos de paixão existem numa ténue linha entre o prazer e a sobrecarga. Quando fiz da escrita a minha profissão, demorei anos para voltar a escrever por prazer; pois ninguém me ensinou o que fazer para relaxar quando o meu hobby, o meu escape, se tornou um trabalho. 

Então, para começar, peço-te que tires um tempo para costurar e bordar à vontade, quiçá até a tua reforma ser formalizada. Se quiseres, procura um curso faz um curso manter focada e relembrar algumas técnicas ou compra um livro sobre o assunto para te desafiares. Mas fá-lo por prazer, reaviva a chama da paixão por essa habilidade em ti—como mencionei antes, tens os factores estabilidade financeira e tempo a teu favor.


Durante esse período, vai registando o que tens notando, como te sentes antes e depois, os desafios, os prazeres, o que não gostas, notando padrões… Regista tudo. 

Após esse período, esboça a tua visão sobre essa nova carreira, sê ousada, insana, sonhadora. Põe tudo no papel, o possível e o imaginário. Reflecte mais afundo sobre os alicerces desse novo trabalho, utiliza estas perguntas para te guiar: 

  • Que tipo carreira queres ter?
    Pensa na tua carreira actual como uma bússola, o que gostarias de manter e o que gostaria de fosse diferente?
    (Exemplo: para é importante ter um método de trabalho que me dê flexibilidade para parar durante alguns meses no ano e só me dedicar à escrita de ficção)

  • O que é que mais gostas de costurar/bordar e o que menos gostas?
    Revisita os teus registos. Saber os teus limites desde o início ajuda a definir o que vais criar para vender e a derrubar a ideia de que só porque estás a começar tens de aceitar “qualquer coisa”.
    (Exemplo: eu já não trabalho com correcção ortográfica porque é um trabalho muito moroso e só traduzo livros cuja versão traduzida eu gostaria genuinamente de ler) 

  • O que é ter sucesso para ti nesta nova profissão?
    Pensa em momentos, elementos, factores que te darão a certeza que sim, estás no caminho certo e que sim, vale a pena.
    (Exemplo: o meu é quando as minhas clientes relatam que através do programa, além de incluírem a escrita nas suas vidas, se descobriram também de outras formas através dela)

Depois, é o momento mais mão na massa, de pensar com mais intenção no processo de compra e venda. Actualmente a venda de produtos pode ser feita de três formas:

  • Loja física: alugas um espaço, abres uma loja e vendes as peças. 

  • Loja virtual: crias uma loja virtual no Etsy, por exemplo, e carregas fotos das peças para vendê-las. 

  • Online: usas uma rede social para publicitar as peças, construindo um conceito à volta da marca (e das peças), uma narrativa, uma estória que vai envolver potenciais comprados e tornar mais pessoal—e emotivo—o processo de compra e venda.

A longo-prazo, pode ser que usar os três métodos faça sentido para ti, mas neste momento inicial, recomendo focares apenas em um que não seja muito dispendioso. 


Eu nunca vendi produtos físicos, forneço mais serviços, então sou a favor do método online. O bom do online, é que existem diferentes plataformas com funcionalidades diversas para satisfazer todos os gostos. As mais comuns para o teu tipo de negócio são o Instagram (criar um perfil) e o Facebook (criar uma página e juntar-te a grupos relacionados ao que vendes).

Deves estar a perguntar-te como é que vais criar uma narrativa à volta da marca e das peças, bem aí é que entram os registos que fizeste durante aquele mês inicial. Nesses registos, tu tens a essência emotiva do que tu fazes, o teu porquê, a razão de existir de cada peça e, mais importante, o como (fundamental no trabalho artesanal para demonstrar o valor de cada peça criada). 


Por exemplo, se o teu foco é costura artesanal, podes criar uma capa para livros com espaço para esferográfica e bloquinho de notas. A narrativa pode ser em torno da tua filha ou neta que é uma leitora assídua e adora fazer anotações enquanto escreve, mas dificulta-lhe ter de carregar o estojo ou um caderninho com livro. Por isso criaste esse modelo maleável em tecido e um outro com tela que pode ser personalizado com bordado. Aí incluis algumas imagens com exemplos, o nome da pessoa em bordado, um tecido mais neutro, ou mais colorido... Por aí.


Caso te sintas um pouco perdida, podes procurar uma mentoria de alguém que ensine um modelo de negócios específico para quem costura e borda. Recomendo sempre começar com algo específico e focado no que tu fazes e depois de aprenderes as bases, se sentires necessidade, procurar então mentorias ou cursos de negócios mais generalizados.


Para terminar, lembra-te que no fim do dia faz-se o que se pode como se pode. Então nem sempre vai dar para ser algo super elaborado e perfeito e acontece. Mas mais importante, não te esqueças de te divertires, de ter prazer com a costura e com o bordado.


Espero que a minha carta seja a última gota que vai fazer o teu copo de coragem transbordar e mantém o contacto, envia-me fotos das tuas peças e da tua loja (virtual ou não) quando criares. 


Com carinho,

Déborah


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