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Slow J: “A música Portuguesa do futuro é uma música que é filha de todos os PALOP”

April 30, 2023

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A pandemia e a paternidade ofereceram-nos um Slow J diferente. Deixou-se de maus hábitos (ou pelo menos de alguns), faz exercício, inscreveu-se em aulas de canto e consulta um psicólogo. Está numa corrida contra o tempo para criar a melhor versão do João Coelho, o homem, e do Slow J, o artista. A prova, vamos ouvi-la no próximo álbum, a ser lançado este ano. Conversámos com o artista sobre esta sua nova forma de se observar, ser e criar, da música Portuguesa e os seus filtros e de como pensa a sua internacionalização.

“Estou a permitir-me apostar em mim próprio e a dar-me a possibilidade de ir mais longe”, diz-nos. O objetivo é olhar para o físico, mente e espírito e perceber toda a sua potencialidade e alcançá-la.

Não é possível falar desta nova fase de Slow J sem falarmos da sua base, porque é dela também que parte a sua descoberta enquanto músico.

Slow J
Imagem BANTUMEN

Numa família que partilha mais do que uma cultura, é natural pensar-se que os seus rebentos beberão dessas raízes de forma fluída. Nem sempre assim é. Slow J, cuja discografia cria uma convivência sonora espontânea entre as sonoridades contemporâneas populares de Portugal e de Angola, não cresceu a ouvir as kizombas, kilapangas ou os sembas. O pai, a parte angolana, relegou a passagem de testemunho cultural – que no seio familiar é indissociável do divertimento – para segundo plano, em benefício das responsabilidades. “Ele sempre foi um gajo bué presente. Sempre esteve bué lá connosco, mas muito ligado ao trabalho – pelo menos, associo-o assim à minha leitura dele – e pouco ao divertimento, ao sair à noite, à festa e à musica. Inclusive, o eu ter começado a minha carreira fê-lo reconectar-se com a música que ele gostava de ouvir quando era puto e reconectar-se com o prazer de ouvir música”, explicou-nos.

Esta conversa surgiu durante uma entrevista, há cerca de um mês, pouco depois de o artista ter-se estreado no palco da Colors x Studios, com “Grandeza”. Para quem não está familiarizado com a sua arte, o jornal português Expresso escreveu em 2020 que Slow J “é um dos nomes mais promissores do hip hop nacional”. Não é apenas isso. Slow J é o reflexo do potencial que é a assunção consciente de todos os condimentos pluriétnicos que fazem da música portuguesa o que ela é hoje – uns diriam que é desde sempre. Sobretudo, porque a música é uma casa que “dá para mongope, dá para PALOP”, é uma casa “onde cabem todas as cores” e “onde come um comem todos”, tal como ouvimos em “You Are Forgiven”.

Sinto que na música estou constantemente a tentar descrever esse mundo porque nasci nele e acho que esse mundo vem aí

Slow J

Cada vez que entra em estúdio, Slow J não pensa na forma nem no resultado. As suas experiências, vivências e envolvência levam-no a querer que a música que produz soe àquilo que sente. “Cresci numa bolha que acho que não existe, na realidade, mas que acho que é o futuro. Eu cresci no futuro“, diz-nos ao explicar que o pai e os seis tios casaram com pessoas brancas portuguesas e que, enquanto criança, achava que todos os pais eram pretos e todas as mães eram brancas. “Todos os meus primos são de tonalidades diferentes. Não há dois da mesma cor. À nossa mesa sempre foi natural sentarem-se pessoas de todas as cores, que vinham de todos os meios”, explica. “Então, sinto que na música estou constantemente a tentar descrever esse mundo porque nasci nele e acho que esse mundo vem aí, ainda não chegou”.

É partindo dessa experiência que o artista acredita que a riqueza de Portugal está intrinsecamente ligada à sua multiculturalidade. “Acho que as pessoas individualmente sabem mas a consciência coletiva não. Quando o turista chega ao aeroporto e pergunta o que se ouve diz-se Fado e isso é uma coisa que gradualmente vai mudar”, considerando aquilo que se ouve nas ruas, nas rádios e nas plataformas de streaming.

Em estúdio, facilmente reúne-se com pessoas com origens plantadas em diferentes geografias. É deixar cada elemento criar da sua própria experiência, permitir o fluir desse acasalamento sonoro e assistir à ascensão da música Portuguesa tal como ela é. “A música Portuguesa do futuro é uma música que é filha de todos os PALOP. É uma inversão da ideia. Não são os PALOP que são filhos do imperialismo. Portugal é uma “porcentagem gigante” dos filhos de brasileiros, de angolanos, de guineenses, de cabo-verdianos e etc., e a sua música é também ela parte desse retrato.

Slow J
Imagem BANTUMEN

Atualmente, com 30 anos (21 de setembro de 1992) e quatro álbuns lançados , o período de pandemia e a paternidade fizeram-no olhar para si de outra forma. Quer ser e estar melhor. Não com a arrogância competitiva entre outros, mas consigo próprio. Os confinamentos e encontrar-se fora do estúdio foram processos impertinentes mas que provocaram um shift, como o próprio disse. Decidiu ganhar novos e melhores hábitos, fazer exercício, dormir melhor, ir a um psicólogo e fazer aulas de canto. É aí que surge “Where You @”, um banger que anuncia esta nova fase e o que aí vem com o próximo projeto. “Depois do Slow-Fy, queria lançar uma cena de ‘cara feia’. ‘Where you @’ é o som que vai lançar o caminho até ao álbum. É um momento novo. É um som que fala bué sobre a ideia de corpo, mente e espírito, e de como essas coisas têm de ser trabalhadas para tu expressares o teu potencial real.”

Apesar de não revelar detalhes, a certeza com que ficamos é que a sua música será, ao ouvido, a mais agradável possível mas sempre regada de essência, coerência e de curiosidade de se descobrir a si e ao que o rodeia.

Ouve o resto da entrevista no player abaixo ou através do YouTube e descobre mais sobre o músico que, atualmente, tem Burna Boy como, “talvez”, o seu artista preferido por este estar “anos à nossa frente, em termos de estética, escrita e melodia”.

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