Em outubro de 2023, a Versus – produtora de eventos responsável pelos grandes nomes do Hip Hop norte-americano, em Portugal – anunciou o regresso de 6Lack a terras lusas, depois de ter passado pelo festival Meo Sudoeste em 2019. Desta vez o encontro deu-se na última sexta-feira (9), no Lisboa Ao Vivo.

Com um concerto completamente esgotado, recebemos o convite para o entrevistar e vê-lo atuar. No meio da correria do dia, entre os ensaios da banda e outras entrevistas, conseguimos trocar algumas palavras com o artista. 6Lack lançou em março do ano passado o seu terceiro álbum de originais, Since I Have A Lover, apresentado agora ao vivo na Europa. A digressão do cantor norte-americano teve inicio propositadamente em Lisboa, através da Versus.

Na nossa conversa com o artista, falámos sobre o seu processo criativo, da escrita deste último trabalho, as grandes diferenças que sentiu desde o primeiro álbum até ao Since I Have A Lover, a necessidade de responsabilizar-se pelas suas ações e do facto de ter sido necessário fazer terapia.

“Tive de tratar da minha vida e dos meus problemas antes de começar a escrever tanto quanto eu queria escrever para este álbum. Criativamente, não conseguia escrever até dar prioridade à minha vida. Por isso, o processo de escrita foi um pouco diferente, porque normalmente estou habituado a escrever através de qualquer problema que tenha. Desta vez, tive de organizar-me e ter conversas difíceis. E depois, uma vez que tive essas conversas, as músicas começaram a fluir e percebi que seria uma forma mais saudável de o fazer”, explicou-nos em exclusivo.

Mais do que um álbum, Since I Have A Lover foi um trabalho terapêutico para o artista norte-americano. Através da terapia, 6Lack encontrou um meio eficaz de expressar as suas emoções e pensamentos. A possibilidade de dialogar com alguém que oferecesse ouvidos atentos e um ambiente livre de julgamentos foi crucial. Essa dinâmica permitiu-lhe libertar sentimentos e pensamentos acumulados, sem procurar soluções mas sim a compreensão e aceitação dos seus próprios sentimentos. Ao externalizar as suas vivências, o artista conseguiu reorganizar-se internamente, abrindo espaço para criar a sua arte com autenticidade e liberdade. Assim, Since I Have A Lover é reflexo do processo de cura e autoconhecimento do artista.

Ao fazer uma retrospectiva dos seus últimos trabalhos, principalmente do primeiro álbum, FREE 6LACK, lançado em 2016, até ao Since I Have A Lover, lançado em 2023, o artista revela um caminho de libertação. Na altura do primeiro projeto, estava “quase encostado à parede, e era um sítio muito esperançoso, mas ao mesmo tempo, um lugar escuro. Enquanto, onde estamos agora, é ainda mais esperançoso e agora lido com a experiência de saber o que acontece quando cuido das coisas e do meu corpo. Foi tudo como uma preparação para onde estamos, mesmo que as áreas sejam completamente diferentes, não se pode ter uma sem a outra”, acrescentou.

Se o álbum FREE 6LACK deu-o ao conhecer às pessoas e ao mundo, East Atlanta Love Letter mostrou o seu lado mais romântico e melancólico. Já Since I Have A Lover, pô-lo nos holofotes da Europa. E foi por isso mesmo que Ricardo Valdez Valentine Jr – nome de registo – começou a sua nova tour em Lisboa, capital que já o tinha recebido em 2019.

“A intenção [deste álbum] era fazer algo que fosse diferente e fresco. Tenho de continuar a empenhar-me em ser realmente um artista e ser um artista é apenas confiar em si próprio e fazer coisas com que me sinto bem e lançá-las. E, normalmente, com isso, atrai-se sempre uma nova vaga de pessoas. Desta vez foi bom ver a recepção, não só em casa, mas também no estrangeiro”, concluiu.

Nascido em Baltimore e criado em Atlanta, nos EUA, 6Lack é sem dúvida uma das vozes mais marcantes da atualidade que navegam entre o R&B e Rap. Cinco anos depois de ter lançado o seu último trabalho descográfico [East Atlanta Love Letter], em Since I Have a Lover, mostrou-se um homem melhor, mais consciente de si, e uma pessoa que se preocupa com a mensagem que quer transmitir assim como o que sente. Este trabalho, embora num registo mais internacional, mantém a sua essência musical, lançado em duas versões: estudo e sono.