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O que está a acontecer em Kivu e que deverias saber

28 de maio de 2015, Bunia, Província Oriental, RD Congo: Martin Kobler, Chefe da MONUSCO, toca "percussões pela paz" durante a inauguração de uma escola | CC
28 de maio de 2015, Bunia, Província Oriental, RD Congo: Apesar da paz volátil durante décadas, Martin Kobler, Chefe da MONUSCO, toca "percussões pela paz" durante a inauguração de uma escola | CC


A crise humanitária na República Democrática do Congo (RDC) alcançou níveis alarmantes em 2023, com altos índices de violência e deslocações forçadas de pessoas, especialmente na província de Kivu do Norte do país. Segundo Germain Lubango Kabemba, representante dos Médicos Sem Fronteiras em Goma, a situação na província é catastrófica, com deslocamentos massivos de pessoas em Rutshuru, Nyiragongo e Masisi devido aos confrontos entre grupos armados. O contexto histórico e geo-político sobre as tenções entre a RDC e o Ruanda, que estão na origem da situação atual, é extremamente complexo e remonta ao tempo em que a região ainda estava sob domínio belga. Neste texto, com o gancho do artigo de opinião de Lea Komba, fazemos uma síntese do que está a acontecer e que levou ao recorde de mais sete milhões de pessoas deslocadas. 30% são crianças desacompanhadas.

A violência escalou desde outubro de 2023, agravando a crise humanitária. Em dezembro, durante este cenário conturbado, a população local preparava-se para as eleições presidenciais. Felix Tshisekedi foi reeleito Presidente da República Democrática do Congo (o primeiro mandato foi iniciado em 2019), ao conseguir 73 por cento dos votos expressos. A população espera que Tshisekedi concentre a sua atenção em encontrar vias para a paz na região.

Mais de duas décadas de apoio ocidental inútil

Considerando a ineficácia das suas ações no terreno, e a pedido de Felix Tshisekedi, depois de 25 anos de implantação, as Nações Unidas confirmaram a retirada da força de paz Monusco da RDC até ao final de 2024. A primeira fase dessa retirada começa com o encerramento dos postos policiais e militares na província de Kivu do Sul, prevista para ser concluída até abril de 2024. O governo congolês e a ONU divulgaram uma declaração conjunta a esse respeito.

Num rastilho que teve como ponto de partida ações similares dos governos do Mali, Sudão do Sul e República Centro-Africana, e apesar da situação volátil de insegurança, o governo congolês exigiu a retirada “acelerada” das forças de paz da ONU, alegando a sua desconfiança nessas missões e ineficácia na proteção dos civis. A violência de grupos armados e milícias assolam o leste da RDC há três décadas.

O escalar da tensão

Em 2022, aconteceram vários ataques pelas forças dos dois países nos seus respectivos territórios. A crise está relacionada à ofensiva contínua do Movimento 23 de Março (M23), criado por rebeldes congoleses na sequência da guerra de Kivu [2004]. A RDC, as Nações Unidas, os Estados Unidos e outros países ocidentais acusam o Ruanda de apoiar ativamente o M23. Por sua vez, o Ruanda acusa a RDC de apoiar as Forças Democráticas pela Libertação do Ruanda (FDLR), grupo de resistência constituído por hutus [grupo étnico no governo em 1994 e cujos extremistas foram responsáveis pelo genocídio do Ruanda] do leste da República Democrática do Congo.

Tanto a RDC quanto o Ruanda negam o apoio ao FDLR e ao M23, respectivamente, apesar de pesquisas e relatórios confirmarem as alegações de ambos os lados.

No dia 5 de dezembro, a RDC anunciou que 272 civis foram mortos num massacre na cidade oriental de Kishishe, em Kivu do Norte. O governo congolês culpou o M23, que negou as acusações. Uma investigação foi aberta pelo procurador-geral da RDC.

Num discurso a 9 de dezembro, o Presidente congolês Félix Tshisekedi comparou o comportamento de Kagame ao de Adolf Hitler, provocando a indignação do governo ruandês.

  • Um jovem pai de família, do povo pigmeu, durante uma visita da MONUSCO ao um campo de refugiados | CC

Kivu, um território rico e alvo de cobiça

As relações modernas entre a RDC e Ruanda têm origens que remontam à era colonial. Ambos os países foram colonizados pela Bélgica, entre 1919 e 1960. Após a Guerra Civil Ruandesa e o genocídio, milhões de Hutus fugiram para o Zaire (antiga RDC), levando a ofensivas militares por parte de Ruanda e países aliados em 1996. Sem mencionar as ingerências estrangeiras, tanto a Primeira como a Segunda Guerras do Congo, que envolveram fortemente o Ruanda, devastaram a RDC, cujos efeitos ainda são sentidos no século XXI. Esta história de conflito permanece uma fonte de tensão e desconfiança entre as duas nações.

Apesar dessas restrições e desafios, Kivu do Norte mostra sinais de um setor privado dinâmico e um potencial de crescimento considerável. A província é rica em recursos agrícolas e minerais, como estanho, ouro, diamantes, coltan e cobalto. Contudo, a insegurança generalizada e a fraca aplicação da lei significam que muita atividade económica é ilícita, especialmente na mineração e extração de recursos naturais. A maioria da população ainda depende da agricultura de subsistência. Os últimos anos testemunharam a reemergência tímida de culturas de rendimento como tabaco, café, chá, cacau e palma, e a chegada da mineração mecanizada. Embora Kivu do Norte esteja a mais de 1.500 km de Kinshasa e permaneça em grande parte desconectada do resto da RDC, a sua posição fronteiriça com o Ruanda e o Uganda, colocam a região numa posição vantajosa para se beneficiar do comércio regional e internacional para o leste.

Num marco sombrio, a ONU anunciou em outubro que a RDC tem quase sete milhões de pessoas deslocadas, com cerca de cinco milhões concentradas na parte oriental do país – um recorde. Quase 30% das crianças deslocadas de Kivu do Norte durante os confrontos armados estão desacompanhadas ou perderam o rasto dos pais durante a fuga.

Curiosidades sobre a RDC

1 – É o segundo maior país de África e o quarto maior do mundo.

2 – É considerado o país mais rico do mundo em termos de riqueza em recursos naturais. A maioria dos depósitos de minerais brutos permanece inexplorada e tem um valor estimado em 24 trilhões de dólares. Estes depósitos incluem as maiores reservas mundiais de coltan e quantidades consideráveis de cobalto.

3 – Um legado do período colonial belga é a preferência avassaladora por grandes quantidades de maionese em quase tudo — carne, peixe, bananas fritas, mandioca, ervilhas e salada são apenas alguns exemplos.

4 – O urânio usado para fabricar bombas atómicas na Segunda Guerra Mundial em Manhattan foi obtido da Mina Shinkolobwe na província de Katanga.

5 – O Rio Congo sozinho merecia um artigo mas ficam aqui algumas curiosidades: com um comprimento de 4.700 quilómetros, é o segundo mais longo do continente e o nono mais longo do mundo. Devido aos seus inúmeros afluentes, possui a rede de vias navegáveis mais significativa de África; tem o maior potencial hidroelétrico do continente e um dos maiores do mundo, sendo que apenas dois por cento foi desenvolvido;

6 – É o segundo maior país florestal do mundo. Absorvendo mais carbono do que a Amazónia, a Bacia do Congo é conhecida como os “pulmões de África” e é o maior sumidouro de carbono da Terra.

7 – Nos anos 90, a música congolesa era a única música ouvida em quase todo o continente africano, com músicos como Koffi Olomide, Papa Wemba e Werrason como protagonistas dessa disseminação.

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