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A arte de Steve McQueen, dos subúrbios para Hollywood

Steve McQueen
Steve (Rodney) McQueen @Edouard Bernaux/News Pictures

A arte entrou cedo na vida de Steven Rodney “Steve” McQueen. Nascido em Londres, a 9 de outubro de 1969, começou como artista plástico e só depois entrou no mundo do cinema, tornando-se num dos realizadores mais requisitados de Hollywood.

Steve Mcqueen é um cineasta, produtor, fotógrafo e escultor britânico. Tudo começou na sua casa em Ealing, um subúrbio da capital inglesa, em março de 1983, Steve tinha 13 anos.

O sonho de ter uma vida e uma carreira pareciam estar longe da vista de Steve. Criança pobre e negra, três palavras que conjugavam bem entre si, palavras que tinham força e cambaleavam no pensamento de uma criança de 13 anos que toda a vida foi subestimada por isso mesmo. Em confissões ao Hollywood Reporter, Mcqeen recorda as memórias de infância: “se és pobre, se pertences à classe trabalhadora, ninguém vai fazer um esforço (…) era brilhante, era inteligente, era isso tudo. Mas, ao mesmo tempo, se és pobre, ninguém se vai incomodar a tentar descobrir mais sobre ti”.

O primeiro contacto de Steve com as artes foi ainda em criança. Com quatro ou cinco anos fez um desenho sobre a sua família, que foi escolhido para fazer um cartaz tão grande que cobria a fachada da Biblioteca de Shepherds Bush, em Londres.

Mcqueen não tem um currículo grande de filmes, conta apenas com quatro longas-metragens e umas tantas curtas, mas tornou-se dos mais requisitados em Hollywood que continua a impressionar o público e a indústria cinematográfica.

A dislexia fazia parte da vida de Steve, com uma pala no olho por este ser preguiçoso, via para lá da realidade que lhe era apresentada. Jogava à bola, o que lhe deu um lugar na equipa de St. Georges Colts. Estudou em Hammersmith e no West London College.

Formou-se em Arte e Design no Chelsea College of Art and Design e decidiu novamente estudar Artes Plásticas no Goldsmiths College, na Universidade de Londres – onde acabou por se interessar por cinema. Mas, trocou Goldsmiths por uma breve passagem pela Tisch School da Universidade de Nova Iorque, nos EUA.

O realizador queria mais, e em 1996, mudou-se para Amesterdão. Outra vida, um outro olhar: as bicicletas nas ruas, as casas em barcos nos rios e as praças cobertas de flores de todas as cores, deram-lhe um amor, Bianca Stigter, jornalista e editora do NRC Handelsblad, com quem tem dois filhos, Alex e Dexter.

Mas a vida tinha outros planos para o pequeno sonhador. Com 49 anos, o realizador britânico não é o típico que estamos habituados a ver, com um estúdio ou com amigos e colegas da mesma área, não se interessa em agradar as tendências ou os gostos tradicionais ou entrar em projetos cinematográficos mais comerciais. Steve não tem um estúdio, o que cria é a partir de sua casa, enquanto cozinha ou limpa e aspira.

Este mês estreou-se em Portugal o novo filme de Steve Mcqueen, Widows, considerado um dos candidatos aos Óscares, com a participação especial de Viola Davis. Sobre este novo trabalho de Mcqueen, o mesmo diz que quis interagir com um público mais alargado.

A longa-metragem é precisamente “uma história sobre aqueles que têm sido subestimados durante muito tempo”, e pode-se ver no filme isso mesmo,  a produção de um homem com o pensamento da criança de Ealing com 13 anos, altura em que se debatia entre estereótipos. 

Não há arte específica, existem vários tipos de artes de várias formas e tamanhos. Steve, não se deixou ficar apenas por um tipo de arte e abriu os horizontes e deixou-se influenciar artisticamente por artistas internacionais como, Andy Warhol, os soviéticos Sergei Eisenstein e Dziga Vertov, o grande rival de Charlie Chaplin Buster Keaton, o dinamarquês Carl Theodor Dreyer, o sueco Ingmar Bergman, os grandes cineastas franceses Robert Bresson, François Truffaut e Jean-Luc Godard ou até os mais contemporâneos como Wong Kar-Wai.

 

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I morgen kan du møde dette stærke hold i din biograf👊💥 #Widows #SteveMcQueen #ViolaDavis #MichelleRodriguez #LiamNeeson #elizabethDebicki

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Chegou a ter contacto com a arte pop, uma aposta na instalação de vídeo. Produziu o filme “Drumroll” que lhe valeu o Prémio Turner –  o maior reconhecimento concedido a um artista visual britânico, em 1999. 

Anos depois, em 2006, produziu “Queen and Country”, que de alguma forma homenageava às mortes dos soldados britânicos no Iraque, onde apresenta os seus retratos como se fossem uma folha de selos. A arte mantinha-se bem presente na mente de Steve Mcqueen, em 2011 foi nomeado Comandante da Ordem do Império Britânico em 2011, pelos seus trabalhos nas artes visuais.

Em 2011, numa entrevista ao The Guardian, mostrou o seu desagrado e descontentamento a um dos seus amores, a arte: “Estou farto do mundo da arte, para ser honesto. Não vai muito além do facto de andar sempre atrás da sua própria cauda e torna-se entediante”.

O seu mundo cinematográfico sempre foi baseado nas suas vivências. A criança de Ealing cresceu e criou uma carreira com personagens confrontadas com a sua existência, a dos outros e a de situações que as perseguem, as suas produções são um pouco da sua própria essência. 

O filme Fome (2008), retrata isso mesmo, a luta de um ativista do IRA,  Bobby Sands, que desiste de comer para lutar pelo estatuto de preso político, numa prisão na Irlanda do Norte. Steve Mcqueen se reviu nesse papel, não pela prisão mas sim pela luta contra todo aquele subúrbio de Londres onde crescera, para se tornar naquilo que queria ser e que hoje é.  

A sexualidade é para muitos um assunto tabu, que não pode ser falado publicamente, considerado vergonhoso, no filme Vergonha (2011), a personagem debatia-se com a sua vergonhosa compulsão sexual. Onde Mcqueen quis pôr as pessoas a falar sobre assuntos considerados tabus, tal como a sua infância o foi durante muito tempo – a sua vergonha escondida.

Em 12 Anos Escravo (2013), que lhe rendeu o Óscar de Melhor Filme, em 2014, tornado no primeiro realizador negro a recebê-lo, conta a história de Solomon Northup, um escravo que anseia por liberdade enquanto tenta fugir de uma crueldade sem fim. Os pais de Mcqueen têm origens das ilhas das Caraíbas, um lugar onde a escravatura foi muito sentida e deixou marcas profundas. 

 

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Após quatro anos de pausa, Widows (Viúvas, em tradução livre) é um filme com uma narrativa completamente diferente do que Mcqueen está habituado a fazer, é mais comercial. Acaba por ser uma revolta contra a ordem social das coisas, o clássico heist movie e com um elenco muito bem escolhido, com atrizes de renome como Viola Davis, Liam Neeson, Michelle Rodriguez, Colin Farrell, Robert Duval ou Manuel García-Rulfo.

O filme foi escrito por Steve Mcqueen e pela a autora de “Gone Girl” e a série “Sharp Objects”, Gillian Flynn. É um filme de ladrões e polícias em versão feminina, que acaba por ser mais que isso: é sobre “mulheres que foram julgadas pela aparência e pelo facto de serem consideradas incapazes”, explicou numa entrevista ao diário britânico Telegraph. “Já senti o mesmo tipo de olhar sobre mim”.

Steve Mcqueen não esteve quatro anos só a preparar o filme, mas sim envolvido num projecto fotográfico, que tem como objetivo fotografar todos os alunos do terceiro ano das escolas de Londres e analisar os retratos dessas dezenas de milhares de crianças de toda a capital inglesa durante os próximos nove meses.

Para Steve é “uma necessidade urgente de refletir sobre quem somos e sobre onde viemos e o que é o futuro”, captando a excitação, a ansiedade e a esperança de um ano tão importante na vida das crianças de sete e oito anos, através de uma fotografia da turma. O projecto é intitulado de “Steve McQueen: Year 3”, e estará em exposição no Tate Britain, em Londres, entre novembro de 2019 e maio de 2020 e terá entrada livre.

Não é fácil transformar tudo aquilo que põe a mão em arte, mas Steve Mqueen consegue e explicou em entrevista ao “Business Insider” como: “I gotta guy (tenho um gajo para isso).  Trata-se de conseguir engendrar um plano de forma inteligente, portanto: “tenho um gajo para isso”.

A criança de 13 anos de Ealing, ainda vive em Steve e continua a lutar por aquilo que é realmente importante para ele, 36 anos depois, mesmo que o faça de forma ficcional. O sentimento que sentia de injustiça quando criança de uma Inglaterra impregnada de racismo e onde o status social era sobrevalorizado, fazem dele um dos melhores produtores e argumentistas  de Hollywood,  e também melhor pessoa. 

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