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“Udjus di Guineenses e Djintis Di Guiné-Bissau”, a primeira exposição internacional de Young Nuno

Young Nuno
Young Nuno

Depois de cerca de um ano da estreia no Centro Cultural Português de Bissau, com a exposição Substantivo Feminino Arte, Young Nuno marca mais um passo importante na sua carreira com a primeira exposição internacional, Udjus di Guineenses e Djintis Di Guiné-Bissau. O acervo, tal como o título indica em crioulo, revela os olhares e as gentes da Guiné-Bissau e passou pela Biblioteca Pública Municipal de Setúbal (Portugal), durante os meses de agosto e setembro.

Nuno Ala Tamba, o seu nome de registo, descobriu o talento para as artes plásticas a partir dos cinco anos, inspirando-se nos gémeos ilustradores guineenses Manuel e Fernandes Júlio, referências da banda desenhada da década de 1980. Era através dos famosos “quadradinhos” que, entre a comédia e realidade, contavam histórias ao povo. Com recurso a lápis, quadros e tintas de variadas cores, Nuno encontrou a forma ideal para manifestar as suas ideias sobre assuntos culturais, sociais, políticos, entre outros.

Em Portugal, na Biblioteca Pública Municipal de Setúbal, Nuno expôs um acervo de 34 obras em telas, fotografias e murais que apresentam um pouco da realidade guineense. Com curadoria de António Garinho, Sofia Conde e Miguel de Barros, as obras entregam ao público a positividade guineense, cultura, beleza e reflexão da vida

Em entrevista à BANTUMEN, o artista contou que, apesar de estrear-se numa zona fora da capital, o balanço que faz é positivo: “Foi a primeira vez que fiz uma exposição aqui, foi a primeira vez também que vim para Portugal. E depois, fiz uma exposição numa zona que não é no centro de Lisboa”, contou-nos, sublinhando o facto de ter recebido a visita de muitos guineenses, e não só, para ver a exposição. “Hoje a minha exposição está entre as mais visitadas da terra [de Setúbal]”, disse-nos Nuno, de acordo com as informações que lhe foram transmitidas.

A ideia da realização da exposição surgiu de uma amiga que, juntamente com outras pessoas que conheceu entretanto, como Miguel de Barros e António Garrinho, tornaram a ideia em realidade. Imbuído no objetivo de fazer diferente quando se trata de mostrar a identidade guineense, história, costumes e cultura, como artista guineense, Nuno sente que tem uma responsabilidade acrescida. O objetivo é “elevar o meu país a um outro nível mas de uma forma positiva com o meu trabalho, com a minha arte”, confidenciou-nos.

Nas escolas, damos mais história dos líderes europeus e decidimos contar a história dos nossos líderes através da arte do bar

Young Nuno

“Talvez o país em que vivo e a sociedade não estão ainda prontos para lidar com a arte, principalmente, com artistas plásticos. Achamos que arte plástica é perda de tempo”, descreve Nuno sobre a forma como a classe artística e o seu trabalho é observado pela maioria, num paralelo ao que acontece com os músicos da cena hip hop. “Há pessoas que pensam que os que cantam [rap] são bandidos. (…) A nossa sociedade não está muito pronta para lidar com esse tipo de coisas”, referiu, argumentando que, para resistir, é importante “ser forte, amar a arte e ser persistente”. “É tapar os ouvidos para as palavras negativas”, reforçou.

Outra coisa que afeta o desenvolvimento das artes na Guiné-Bissau é a situação política do país. Segundo o artista, dado o nível de vida precário e salários baixos, poucos têm a possibilidade de pensar em comprar arte. Por isso,, “os artistas às vezes exigem muito do turista. Na Guiné é assim, os turistas é que mais compram”, disse. Por outro lado, a instabilidade do país acaba afastar potenciais turistas. “Essa é uma das coisas que mais nos afeta”. Contar com as estruturas estatais ou privadas poderia também ser um recurso para a sobrevivência dos artistas mas Nuno garante que, apesar de haver dinheiro, não há apoios.

Em cima de todas as dificuldades que Nuno relata, há ainda a falta de acesso aos materiais para poder criar. “É o nosso calcanhar [de Aquiles], é um problema. Não há acesso ao material de arte grande, nem lápis, nem tela e nem tinta”, lamentou. Por isso, quem decide agarrar-se às artes não o faz por dinheiro, fá-lo por amor ou por compreender o poder na arte na mudança de consciências.

As artes visuais são ferramentas para manter tradições e perpetuar histórias. Sobretudo onde a informação e educação circulam de forma enviesada e com base nas perspetivas ocidentais. “Temos que a resgatar [a história sobre o período de colonização e descolonização] de antigos combatentes e conscientizar a população. Porque a nossa história não é estudada na escol. Damos mais história dos líderes europeus e decidimos contar a história dos nossos líderes através da arte do bar”, contou.

Desviar-se do caminho que escolheu já não é uma opção, mas já o foi. “Desisti, entrei na universidade e comecei a fazer Gestão”, afirmou. Entretanto, teve problemas de saúde e acabou por desistir da universidade por questões financeiras. Foi aí que pensou em voltar às artes. “Parei e pensei que o meu grande propósito, se calhar, era ser artista. Estava a fugir do meu destino, mas o meu destino arrasta-me para regressar à arte, explicou. A partir daí começou do zero e foi aprender com outros artistas com mais experiência, começando pelos senegaleses Manager e Alpha. Depois trabalhou com o sociólogo e especialista em planeamento Miguel de Barros, com quem teve uma experiência na arte urbana. Em 2018, Nuno foi homenageado pela Secretária do Estado para a Cultura da Guiné-Bissau e em 2020 foi selecionado pelo ex-secretário de Estado da Cultura para fazer uma residência artística no Brasil. Foi o primeiro artista nacional da sua geração a ter essa oportunidade, o que acabou por dar-lhe notoriedade.

Da Guiné para Portugal 

Neste momento, Nuno acha que, apesar de imigrar ser difícil, estar fora da Guiné poderia ser um ponto a favor do seu crescimento profissional. Além de que, a possibilidade de oferecer melhores condições de acesso à saúde e educação à mulher e filha é tentadora. Por isso, enquanto estiver em território português, o objetivo é “focar no novo desafio, conhecer outros artistas e conhecer galerias que possam expandir mais o meu trabalho”, garantiu.

Contudo, a necessidade de crescer não anula a sua guineendade. “Uma coisa que gosto de dizer sempre é para não se esquecer de onde saímos, dos nossos países, porque só assim podemos conseguir chegar onde queremos. Isso é fundamental, não nos esquecermos de onde saímos e o que queremos ser”, é esta a mensagem que Nuno deixa aos seu irmãos lusófonos que se encontra em terras estrangeiras. 

Young Nuno nasceu em Bissau, em abril de 1991, e ali fez os seus estudos primários e secundários. Na Universidade Colinas de Boé, frequentou o curso de Gestão e Contabilidade. Em 2015 participou numa formação de empreendedorismo de curta duração organizada pela INOVALAB, que acabou por tornar-se na base de todo o processo de criação do seu próprio negócio.

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