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Gaby Amarantos, a rainha do tecnobrega

Gaby Amarantos, Batekoo, outubro de 2023 | @ihateflash
Gaby Amarantos, Batekoo, outubro de 2023 | @ihateflash

O tempo abafado em São Paulo dava sinais de que a tarde de sábado, 07, seria chuvosa. Porém, a previsão desfavorável não intimidou aqueles que estavam dispostos a aproveitar ao máximo a segunda edição do Festival Batekoo. A tromba d’água que caiu logo depois das 14h contribuiu para que o calor se multiplicasse. Talvez, Gaby Amarantos tenha feito um alinhamento com as deusas do tempo para que a temperatura se aproximasse com a da sua terra natal, Belém, no Pará, e segurasse a chuva torrencial que viria depois que ela finalizasse sua performance.

Vestida com um macacão futurista, todo preto com diversas aberturas, detalhes em branco e ornamentado com cristais, desenhado por Leandro Benites, ela faz o Memorial da América Latina tremer com a mesma intensidade de vênus em escorpião. Toda sua apresentação traz elementos da cultura no Norte, das as águas ribeirinhas e o carimbó, representados (inclusive) por um saião prateado, a aparelhagem de som, passando pela guitarrada, o rock doido, e, claro, o tecnobrega.

Mesmo longe de casa, Gaby sentiu-se acolhida. “Foi uma troca linda que você olha nos olhos e sente que são os seus te reverenciando, te enchendo de força pra você continuar”, disse no camarim, logo após o show. Isso porque a presença majoritária do festival era de pessoas pretas e da comunidade LGBTQIAP+, assim como o line-up. “Então, quando essa porta é aberta pra mim e eu vejo os meus, o meu povo, que entende da minha cultura, e mesmo quem não conhece está receptivo pra conhecer mais da negritude ribeirinha de Belém do Pará, da Amazônia… Porra, é assim: só respirar e ser feliz”.

Reverenciada, mas também perseguida por quem insiste em não reconhecer suas conquistas, tirando suas palavras e performances de contexto, Gaby Amarantos revela que sente-se isolada por muitas vezes ser a única mulher negra representado o Norte do Brasil. Por esse motivo, sempre que tem a oportunidade provoca os organizadores para que olhem para as artistas da sua região.

“Poxa, vai ter um evento de diversidade em novembro em Salvador, na Bahia, (o Festival Internacional Liberatum) com Naomi (Campbell), Viola (Davis), IZA, Majur… eu mandei uma mensagem muito carinhosa para o organizador pra dizer que tem mulher bonita no Norte também. E  não é porque eu queira ser convidada pra tudo, eu quero ver os meus convidados”, observa.

Gaby Amarantos, Batekoo, outubro de 2023 | @ihateflash
Gaby Amarantos, Batekoo, outubro de 2023 | @ihateflash

“Se não tem Norte não é Brasil”, reafirma Gaby Amarantos durante sua apresentação

Do bairro Jurunas, na periferia de Belém, Gabriela Amaral dos Santos conquistou o Brasil pela potência da sua voz e autenticidade, tanto musical quanto no figurino. Sua ascensão nacional começou depois de “Hoje Eu Tô Solteira”, uma versão tecnobrega de “Single Ladies”, da Beyoncé. Esse também foi o motivo dela ser apelidada de “Beyoncé do Pará”, alcunha que revogou durante o MTV Video Music Brasil de 2012, a qual foi indicada em 4 categorias pelo álbum “Treme”, tendo vencido 3 delas: “Melhor Capa”, “Melhor Artista Feminina” e “Artista do Ano”.

A disseminação da música de Gaby começou pelas ruas do seu bairro, ganhando a cidade e o estado através dos vendedores ambulantes e sistemas de som (os paredões). Com a expansão da internet e o surgimento das plataformas, o raio de extensão aumentou. Porém, ter grandes números de streaming, estar nos principais festivais e arrastar um público gigantesco não representa aceitação nos grandes meios de comunicação.

Dias antes da Batekoo, a cantora foi entrevistada na Nova Brasil, uma rede de rádios de MPB, que recusou a tocar um dos principais singles do álbum “Tecnoshow” por não conversar com o padrão “elevado” dos ouvintes da emissora. Após a exposição de Gaby Amarantos nas redes sociais , a rádio emitiu nota se desculpando pela postura tomada.

 “Por que o funk, por que o tecnobrega, por que o rap, por que o som que a periferia preta do Brasil produz não é para o público elevado?”, questiona. Por outro lado, ela ressalta que vencer essa barreira mostrando sua voz e conquistando espaços antes negado, inclusive sendo convidada para fazer acompanhar a Brasil Jazz Sinfônica, na Sala São Paulo (uma das mais modernas e bem equipadas salas de concerto do mundo), ao lado de Xênia França. “Eu realmente estou sentindo que é uma nova fase. Estou acesa, muito feliz e cheia de vontade de continuar”.

Novamente indicada ao Grammy Latino (a primeira vez foi em 2012 com  duas indicações pelo álbum Treme) na categoria Melhor Álbum de Música de Raízes em Língua Portuguesa, a cantora paraense mostra-se esperançosa, está botando muita fé. Mas essa expectativa não é somente pela possibilidade de ser agraciada com o desejado gramofone dourado.

“A gente está num momento muito especial das pessoas estarem falando muito da Amazônia”, observa. “Como vai ter a COP 30 acontecendo em 2025 em Belém do Pará, já está rolando um movimento internacional das pessoas entenderem e quererem saber da Região Norte, que música toca lá, o que as pessoas fazem e desse outro Brasil, que não é um novo Brasil, é um Brasil que sempre existiu e que agora finalmente está tendo seu reconhecimento e visibilidade”.

A artista também acredita que esse pode ser o momento do tecnobrega ganhar mais espaço fora do país. “Estou sentindo que vai ser uma fase nova… assim como tem acontecido com o funk, acredito que a gente também vai conquistar o nosso lugar porque são primos – tudo família”. Para o futuro, além de continuar fomentando a sua cultura, Gaby Amarantos volta atuar na TV na série “O Corre” (canal Multishow), uma comédia em que interpreta a chefe de motoboys, e coloca no mundo mais 2 projetos: o “Tecnoshow Vol. 2” e o EP “Pirarucool”, que vem antes e é composto por remixes, sendo 2 do álbum “Treme”, 2 do “Poraquê” e 2 do “Tecnoshow”.

“Metade das músicas já estão disponíveis nas plataformas, como “Xirley (Remixada Na Calcinha) com Johnny Hooker e Majur, “Ex Mai Love”, com a Lexa, tem “Eu Não Vou Te Deixar, que fiz com a Leona, que é um a artista trans lá do meu bairro, Jurunas, e agora fizemos duas inéditas, uma com o Hiran, “Principe Negro”- que é pra exaltar a beleza do homem preto – e vai ter também “Selfie”, com as Irmãs de Pau. Muito tecnobrega, muito rock doido, muita música brasileira feita na Amazônia.

Relembramos-te que podes ouvir os nossos podcasts através da Apple Podcasts e Spotify e as entrevistas vídeo estão disponíveis no nosso canal de YouTube.

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