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“É muito difícil surpreender quando tu és o Prodígio”

Prodígio
📷: Matamba Kindala António

O novo álbum do Prodígio, KING2DA, deveria ser a conclusão de um ano perfeito mas acaba por ser apenas o continuar de um década de sucesso.

Osvaldo Moniz foi uma das 100 personalidades homenageadas na PowerList100 de 2022, organizada pela BANTUMEN em parceria com outras plataformas de comunicação lusófonas, como também foi nomeado por um jornal angolano como Artista do Ano, pelo seu papel no movimento hip hop em Português, mas também pelo engajamento em diferentes atividades sociais.

O membro da Força Suprema está focado na carreira a solo e o ano de 2022 assinala, provavelmente, um recorde pessoal: o artista que mais projetos lançou em 2022 a nível lusófono, com sete EPs. A saga tem como título Prodigia-te e cada projeto é dedicado a um país africano de língua Portuguesa, a Portugal e ao Brasil. A produção dos EPs contou com a colaboração de vários produtores e rappers dos respetivos países. Com o objetivo de representarem união, todos os projetos foram lançados a dia 7 de cada mês, entre fevereiro e agosto.

Há ainda outro feito associado ao trabalho que Prodígio desenvolveu no decorrer de 2022 e que venceu o prémio Jóia do Ano, como Melhor Projeto do Ano, organizado pelo projeto angolano Kano Kortado.

O nome Prodigia-te saiu da esfera musical para estender-se à inauguração de um centro juvenil, no bairro do Prenda (Luanda), de onde o artista é natural. O empreendimento tem como propósito alimentar o sonho de jovens daquela zona, criando uma estrutura de apoio ao desenvolvimento e crescimento social.

Ainda no final do ano passado, o rapper trabalhou no lançamento de uma coleção cápsula para a marca de vestuário Rose Palhares e que empregou 30 profissionais de costura.

O álbum KING2DA saiu em formato físico no dia 28 de dezembro, dia do seu aniversário, e chegou às plataformas de streaming na passada sexta-feira 6 de janeiro, com destaque na playlist New Music Friday Portugal, do Spotify.

Neste álbum, encontramos as participações vocais da angolana Anna Joyce, dos portugueses Sara Tavares, SYRO, Jimmy P e Dino d’Santiago, do brasileiro Rincon Sapiência e ainda de Domingos Moniz, o pai, falecido em 2022. Na produção, além do irmão Nilton Moniz, também encontramos os nomes de Sam The Kid, Edgar Songz e Guetto Ace.

O tema que junta pai e filhos, “Afrika”, reflete a condição dos africanos e afrodescendentes na diáspora, com um olhar incisivo sobre a discriminação racial, e é, sem dúvida, uma das melhores faixas lançadas pelo rapper nos últimos anos.

Prodígio, como é que na preparação de um álbum, acabas por lançar sete EPs?

O segredo nisso está quando eu ia lançar o álbum KING2DA em 2020. A ideia era lançar o álbum no aniversário do NG[A]. O que aconteceu foi que perdi o meu cota em setembro e já tinha o álbum a 90%, mas também não era este álbum que vocês ouviram. Quando o meu cota morreu ponderei nunca mais fazer essa merda [música] e tive aquilo que deve acontecer com muita gente. Foi aquele choque de realidade e tudo à volta daquela dor. Depois fui para Luanda e vi a minha cota e apercebi-me que ela tinha ficado dependente de mim. Então, infelizmente, não podia ser egoísta e dizer “ok, não faço mais isto”. Até à data, isto continua a ser a minha fonte de rendimento, então tive de desemerdar-me e não fiz luto, não fiz nada e voltei logo para o trabalho. Agora, depois de tanto trabalho, é difícil dizer que este é o meu melhor álbum. O que pensei foi ‘como é que lanço o álbum mais seguro possível nesta fase da carreira em que tu não passas fome, não tens bué de problemas em casa e a tua única motivação é a dor.’ Então, tinha a cena do projeto, que era algo para fazer na velhice, o centro juvenil, acabei por escrever durante a pandemia, o Prodigia-te, e queria dar nome a isso.

Registei o Prodigia-te como associação e queria criar um “zum zum zum” à volta disso. Por isso criei estes sete projetos dedicados a sete países onde tenho um fã clube, onde já dei concertos, conheço o people e tenho a minha visão desses países. Pareceu uma loucura. Quando um gajo partilhava a ideia chamavam-me maluco: ‘em ano de crise, as editoras estão a lançar dois/três projetos e tu vais lançar sete?’. E ainda nem tinha dito que ia lançar o oitavo. Então, transformei este projeto num ginásio, para me transformar. Porque a prática faz a perfeição. Os projetos foram todos gravados de forma exaustiva. Eu estava a lançar e já estava a gravar os próximos. E, tudo o que fui fazendo ao longo do ano, que senti que era celestial, que senti que estava acima da média, que senti que doía-me e custava-me a ouvir, fui metendo de lado. O álbum KING2DA foi feito dessa forma.

Tenho noção que quando faço o que faço, não impressiona

Prodígio

Como é que ‘alimentas’ a tua caneta?

Não gosto de parecer emocional quando escrevo. Há muita gente a perder tempo e a interagir na Internet que não tem equilíbrio emocional. Um gajo não pode ser mais um a ser emocional na Internet porque aquilo não é vida de verdade. Lembro-me de nós na flor da idade e a escrever ‘BRB’ [be right back, já volto em português] e, hoje, já não saímos da Internet. Já não existe já volto. Estamos na Internet o dia inteiro, então tenho muito cuidado quando escrevo. E, esta é a primeira vez que vou dizer isto, é muito difícil ser o Prodígio. É muito difícil surpreender quando tu és o Prodígio. Qualquer rapper, com exceção de poucos, como o NG e desse nível, que lançasse um álbum com o Rincon Sapiência, Sara Tavares, Jimmy P, Cyro, Anna Joyce, essa merda era de parar. Isso era do people se ligar. Então, tenho noção que quando faço o que faço, não impressiona. Ganhei essa noção há uns cinco/seis anos. É muito difícil impressionar porque eu estava a fazer coisas grandiosas e o people estava a agir ‘ya, é o Prodígio’. E isso é bom e mau. Usei isso a meu favor porque dá-me o gás diferente. Eu lancei os sete álbuns sem budget de promoção. Posso ir à Sony, sentar e ver essas coisas, mas o objetivo era realmente sair da minha depressão. A minha inspiração vem dessas coisas todas. Quando for eu a fazer uma cena, já existe uma cena entre eu e o público que é tipo ‘é o Prodígio que está a fazer e é suposto o prodígio fazer assim’. A minha caneta é alimentada por essa fome. Eu não admito que haja uma participação minha e que digam que esse verso está podre. Quando és treinado para ser um monstro, as pessoas querem que tu caias. Há um desejo que tu falhes e esse desejo é a minha inspiração.

Tu não és só uma das personalidades da PowerList de 2022, como és também o homem do ano em Angola. Estiveste envolvido em várias coisas, além dos sete álbuns, estás 12h horas em Luanda, outras 12h em Lisboa, és chamado para palestras, desenhaste uma coleção, és cara de várias marcas… Como é que encontras tempo? Tens algum sósia? (rs)

A primeira cena é eu ter destruído a minha cena pessoal pela devoção à mudança. Quando decidi que ia carregar o bastão da mudança, que ia inspirar putos pretos, e não só, a viver da música sem terem que ser dançarinos, se não quiserem dançar, quando decidi isso muito cedo – quando abandonei a Inglaterra com um canudo na mão, uma proposta de trabalho com perspetivas de crescer profissionalmente, uma mulher e um filho em casa, para começar do zero e ir atrás do sonho da música – eu sabia que ia destruir a minha vida pessoal. A única forma de conseguir ser omnipresente no showbizz, nos negócios e tantas outras coisas é sendo ausente na vida pessoal. O Prodígio praticamente não existe como Osvaldo. A minha vida é exaustiva. Fisicamente e mentalmente. Não sei quantos anos vou conseguir fazer isto e tenho de começar a pensar nisso. A pensar no luto do meu cota, a pensar em algumas coisas que tenho para fazer. Mas este ano não vai ser diferente do ano passado. Não falando de música só, mas em termos da minha presença em certas salas, fóruns e em posição de decision maker. Não tenho sósias, não tenho é tempo para mim como indivíduo.

Sobre este álbum, senti que está muito mais direcionado a um público português. Está muito mais direcionado para que os miúdos pretos e brancos, em Portugal, interpretem e percebam o que estás a dizer.

Estás certo. Os meus álbuns refletem as fases da minha vida. Para muitos não será o meu melhor álbum, mas é o álbum mais bem conseguido porque é o reflexo da minha pessoa agora. Quem é o Prodígio? Um preto africano criado na tuga. Tenho muita coisa em comum com os tugas. Quando estava a refletir muito a realidade do mundo, a realidade de coisas que eu queria que mudassem, estava a levar mais com o choque de Angola. Então, aquilo refletia a realidade das mudanças que eu queria ver em Angola. O que muita gente me diz sobre o KING2DA é que é um álbum em um jovem na Serra das Minas ou em Cascais, põe play e não vai fazer skip em nenhuma música. Este álbum sou eu.

Quando é que o vais apresentar em Portugal?

Ainda vamos alinhar a comunicação mas vamos começar pelo Hard Club (Porto), dia 24 de março, e Capitólio (Lisboa), dia 1 de abril. Por essa responsabilidade que um gajo sente por esses putos, dos PALOP no geral, e que sente que, por estar engajado em muita coisa, às vezes vamos deixando os putos “em mãos alheias” e os putos precisam de um Prodígio. Os putos precisam de um gajo sem máquina, porque senão a indústria musical está fodida para esses miúdos que não têm dinheiro para patrocinar no Spotify.

Falaste em Spotify, em indústria. Contaste aos quatro ventos a tua grande relação com a Paula Homem (ex-diretora geral da Sony Music Portugal). Hoje é o Ben [Bernardo Miranda] e muita gente torceu o nariz, porque ele está por trás da BridgeTown, do Plutónio… Qual é hoje a tua ligação com a Sony?

Sempre disse publicamente que eu acabava por ser um artista Paula Homem, pela relação que tinha com ela. Quando me foi anunciado que ela ia embora – eu ainda não sabia quem a iria substituir – ponderei ir-me embora da Sony. Mas já tinha na balança o meu team. O meu team Sony é muito forte e temos uma relação de família. Quando a Paula disse-me que era o Ben, fiquei com mais vontade de ficar. Por se uma pessoa com quem tenho uma relação pessoal muito fixe. Não sabia como é que ele se ia adaptar e como seria a dinâmica, mas uma coisa sempre soube, ele trabalha bem para caraças. É uma noção que tenho pela BridgeTown. Ele não iria pôr uma posição em risco para puxar a brasa para a sardinha dele. E está-se a provar que eu estava certo, em acreditar no meu team e no Ben.

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Para sugerir correções ou assuntos que gostarias de ler, ver ou ouvir na BANTUMEN, envia-nos um email para [email protected].

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