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Sabor a Mundo é mais do que um negócio, é uma herança familiar

Arminda Monteiro e Luís Semedo no armazém da Sabor a Mundo / Foto: BANTUMEN
Arminda Monteiro e Luís Semedo no armazém da Sabor a Mundo / Foto: BANTUMEN

Um estudo da UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura) revelou, em 2021, que aproximadamente uma em cada quatro empresárias africanas criou negócios inovadores, e que a tendência é o número continuar a aumentar. Arminda Monteiro faz parte da estatística.

Em 2005, a mulher cabo-verdiana fundou a Sabor a Mundo, uma empresa familiar com base nas suas origens, com o propósito de atender à demanda dos imigrantes em relação aos produtos “da terra”. Com base em Vialonga, arredores de Lisboa, dedica-se à importação, exportação e comercialização local de produtos de proveniência africana, brasileira e indiana.

Este capítulo da história de Arminda começa entre os anos 1960 e 1970, quando mudou-se para Portugal, naquela que é apelidada de segunda fase das migrações cabo-verdianas para terras lusas. Tinha casado recentemente e estava grávida do seu primeiro filho, Luís Semedo, que agora gere a empresa.

Conseguiu instalar-se na Linha de Sintra e o primeiro trabalho foi numa peixaria, onde era responsável pelo trabalho pesado, como carregar e descarregar bacalhau de até 50 quilos, sozinha. Após seis anos de muito esforço, tomou a decisão de trabalhar por conta própria. Sem qualquer tipo de experiência, aventurou-se. Foi primeiro de férias para Cabo Verde, onde concretizou a ideia de criar o seu próprio negócio.

Arminda Monteiro Semedo no armazém da Sabor a Mundo / Foto: BANTUMEN
Arminda Monteiro Semedo no armazém da Sabor a Mundo / Foto: BANTUMEN

De volta a Portugal, começou a vender no seu bairro produtos alimentares do arquipélago. Enfrentou algumas dificuldades pelo caminho, mas Arminda conseguiu abrir uma pequena mercearia. A empresária afirma que não foi fácil ganhar e conquistar clientes mas foi especialmente complexo lidar com o fato de ser conhecida naquela zona. Muitos aproveitam-se disso para conseguir produtos fiados.

“Enfrentei dificuldades atrás de dificuldades. Trabalhava para ter dinheiro no final do mês e, quando chegava esse momento, tinha de garantir que tinha dinheiro. Felizmente, pouco a pouco, o negócio foi crescendo. Mesmo com dificuldades, as coisas melhoravam. Afinal, tudo o que não é uma grande batalha não é uma grande conquista. Até ia para fora comprar certas coisas, como milho e feijão, que tinha de mandar vir de Cabo Verde. Eram produtos muito específicos que não havia em Portugal na altura, especialmente na época do escudo português”, explicou-nos Arminda.

Enquanto contava a sua história, lado a lado com o filho mais velho, Luís Semedo, Arminda mostravam-nos também os cantos da casa. Um armazém de perder de vista, com uma enorme variedade de produtos alimentares empilhados nas prateleiras.

“Como podes ver, aqui temos muita coisa, desde feijão congo, um tipo de feijão de Cabo Verde, milho, bebidas asiáticas, produtos de algumas partes de África como Guiné-Bissau ou Angola, doces do Brasil… Temos um pouco de tudo. Atualmente, é mais fácil conseguir comprar e encomendar através de fornecedores. Antigamente, a minha mãe tinha de apanhar um avião para conseguir certos produtos. Por exemplo, ia para a Holanda, onde existe uma grande comunidade de cabo-verdianos que já comercializavam produtos da sua terra natal naquele país. Lá, conseguia-se facilmente os produtos. Em Portugal, não tínhamos nada disto. Tudo tinha de vir de fora. Ela ia lá buscar, chegava a casa, vendia e fazia o seu dinheirinho, com muito sacrifício e cansaço. Lutou para chegar onde está”, disse-nos Luís Semedo.

Nunca fui a uma discoteca, não saí para me distrair em bares ou algo do género. Tinha um objetivo: trabalho-casa-trabalho

Arminda Monteiro

A certeza de que fez uma aposta certa concretizava-se cada vez que esgotava o stock que acabara de pôr à venda. “Quando trazia os meus produtos, vendia logo. Os dias de hoje são bem diferentes dos meus. Nunca fui a uma discoteca, não saí para me distrair em bares ou algo do género. Tinha um objetivo: trabalho-casa-trabalho. Dormia pouco. Preferia assim, conseguia poupar bem e alcançar os objetivos. Poupar para pagar a casa que construímos e alcançar os nossos objetivos, tanto eu como o meu marido, ele que às vezes tomava conta das crianças para eu trabalhar. Foram sacrifícios necessários para chegarmos onde estamos”.

Atualmente, o destino da empresa está nas mãos dos filhos. Luís assume o cargo de gestor e Paulo é o responsável pelo marketing. No entanto, para Arminda, ainda não é tempo de descansar. Visita constantemente a Sabor a Mundo, acompanha todos os processos e, mesmo sabendo que os filhos desempenham bem o seu trabalho, não consegue ficar parada e gosta de supervisionar as coisas à sua maneira. Se houver um dia que não vá às instalações, é por um motivo de força maior.

Inovação, integridade, responsabilidade, paixão, colaboração, diversidade e qualidade são alguns dos valores que são imperativos no dia-a-dia da empresa, como nos explicam os Semedo. No site podemos ler que “todos os dias lutamos para melhorar um pouco mais, aprendemos com os nossos erros e críticas que nos são feitas, e assim vamos aprimorando e criando novas estratégias para garantir um serviço melhor e dar continuidade ao nosso crescimento”.

Luís Semedo no armazém da Sabor a Mundo / Foto: BANTUMEN
Luís Semedo no armazém da Sabor a Mundo / Foto: BANTUMEN

Para os filhos, este é o legado da mãe. Desde cedo, tornaram-se independentes graças ao exemplo dos pais, à sua luta e perseverança em construir algo sem depender de ninguém. Primeiro foi Luís e depois o irmão Paulo. Depois da escola, ambos ajudavam em pequenas tarefas na mercearia, por iniciativa própria. De certa forma, queriam deixar os pais mais descansados, pois acompanharam todo o processo. “Crescemos no meio do negócio. Enquanto muita gente se habituava a ver os pais irem para os seus empregos, nós não. Nós já acordávamos e tínhamos a mercearia à nossa frente. Os nossos pais já estavam lá a trabalhar e nós íamos ajudar. Isso fez com que nos habituássemos a cuidar do que já era nosso, a fazer o que era necessário. E habituamos-nos a ter isso em casa. Ficou-me um pouco estranho chegar à idade adulta e ter de procurar um emprego. Só fazia sentido dar continuidade ao que os meus pais criaram“, explicou-nos Luís.

Já se passaram 18 anos desde que a Sabor a Mundo entrou no mercado. É a única distribuidora que fornece produtos de origem africana, brasileira e indiana para grandes superfícies. No entanto, não pretendem parar por aqui. Sentem que há ainda muito trabalho pela frente, pois o segmento alimentar está sempre a mudar hábitos e os alimentos estão em constante evolução, com a introdução de novos produtos. “Há muitas referências que identificamos para poder trabalhar. Portanto, é algo que claramente pretendemos continuar a desenvolver e há ainda muito por fazer, muito por crescer. Faço isto há 15 anos. E vejo-me a fazer muitos mais anos, porque gosto genuinamente do que faço. A inovação, a diferenciação, o desenvolvimento de produtos… Queremos também entrar em novos segmentos do mercado”, acrescentou.

Fundada em 2005, a Sabor a Mundo tem como objetivo não só dar a conhecer os seus produtos no mercado europeu, aproveitando de forma positiva a crescente multiculturalidade e um consumidor cada vez mais eclético e disposto a experimentar novos sabores, mas também tem um lado mais social, de ajuda e integração e uma preocupação maior para com a comunidade.

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Para sugerir correções ou assuntos que gostarias de ler, ver ou ouvir na BANTUMEN, envia-nos um email para [email protected].

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